Na liturgia
deste vigésimo oitavo domingo do tempo comum, continuamos a leitura sequenciada
do Evangelho de Marcos. Inclusive, o texto de hoje – Mc 10,17-30 – é a
continuação imediata daquele do domingo passado (Mc 10,2-16). Consequentemente,
o contexto continua sendo o mesmo: o caminho de Jesus em direção à cidade de
Jerusalém, com seus discípulos, que culminará com os eventos de sua paixão,
morte e ressurreição. Durante esse percurso, que é mais um itinerário
catequético e teológico do que geográfico, Jesus é interrompido diversas vezes,
por várias categorias de interlocutores, que lhe fazem perguntas relevantes
sobre a natureza e as condições para o discipulado, sobre as características do
Reino de Deus e os critérios para desse fazer parte. Jesus é questionado, tanto
por personagens externos, quanto pelos discípulos. Há interlocutores que
interagem com interesse e seriedade, com vontade de aprender, enquanto há
outros que o interrogam com malícia, esperando um deslize para acusá-lo de
herege ou blasfemo e, assim, antecipar a sua condenação, como se viu no episódio
do domingo passado, quando alguns fariseus lhe interromperam e interrogaram
sobre a legitimidade do divórcio (Mc 10,2-16). Após respondê-los, sem cair na
cilada, Jesus aprofundou o ensinamento do respectivo tema para os discípulos.
No texto de hoje, embora o tema seja diferente, o esquema é o mesmo: Jesus é
questionado por um personagem externo, com quem interage e, em seguida, pelos
próprios discípulos. Trata-se de um episódio comum aos três evangélicos
sinóticos (Mt 19,16-29; Mc 10,17-30; Lc 18,18-30), sendo que a versão de Marcos
é a mais rica, por ser a mais original, embora a de Mateus tenha se tornado
mais conhecida, como será recordado mais adiante, durante a explicação.
Uma vez que o
contexto é o mesmo do domingo passado, não há necessidade nos prolongarmos na
contextualização. Por isso, partimos para o estudo do texto, começando do
primeiro versículo, no qual se diz que «Quando
Jesus saiu a caminhar, veio alguém correndo, ajoelhou-se diante dele e
perguntou: “Bom Mestre, que devo fazer para ganhar a vida eterna?”» (v.
17). Após uma pausa, o caminho foi retomado por Jesus e seus discípulos.
Durante a pausa, eles estiveram em uma casa, como recordava a passagem lida no
domingo passado (10,10), embora a localização geográfica não tenha sido
fornecida. Certamente, já não era mais a casa de Cafarnaum
que tinha servido de base de apoio para o ministério de Jesus na Galileia. À
essa altura do caminho, eles já tinham saído da Galileia e estavam quase
terminando de atravessar a Samaria, uma vez que já se aproximava da Judeia,
onde ficava Jerusalém. É importante
recordar que a estrada – caminho – é o espaço privilegiado para o ensinamento, sobretudo
em uma comunidade itinerante como a de Jesus e seus discípulos. Além de
expressar a carência de estruturas fixas, o caminho expressa também o aspecto
dinâmico, aberto e missionário da comunidade. O outro espaço privilegiado da
catequese, sobretudo no Evangelho de Marcos, é a casa, como imagem da
fraternidade. No caminho, Jesus e a comunidade estão expostos, qualquer pessoa
pode interagir e questionar, como fez esse “alguém” que, veio correndo ao seu
encontro e ajoelhou-se. Esse personagem é totalmente desconhecido, é anônimo. Pelo
pouco que o texto diz dele, deve tratar-se de alguém muito necessitado de
sentido para a vida, alguém inquieto, preocupado. Tanto é, que vai correndo ao
encontro de Jesus; quer dizer que tem pressa de encontrar-se com ele.
Com a pressa
para encontrar-se com Jesus, o homem anônimo demonstra reconhecer nele a fonte
de sentido para a vida, ao mesmo tempo em que percebe a insuficiência da sua
prática religiosa até então. Essa necessidade e reconhecimento se tornam ainda
mais evidentes com a sua primeira atitude, após a carreira: ele «ajoelhou-se
diante de Jesus». Até então, somente um personagem tinha se
ajoelhado aos pés de Jesus, no Evangelho de Marcos: um leproso, ao suplicar-lhe
a cura, logo no início do seu ministério (Mc 1,40). Isso quer dizer que também
esse homem apressado possui uma enfermidade grave, até aqui desconhecida do
leitor, mas em breve será revelada pelo narrador. Conhecedor profundo de Deus,
o seu Pai, Jesus responde à interpelação daquele homem recordando que «Só
Deus é bom, e mais ninguém» (v. 18). De fato, a bondade era um
atributo de Deus e, consequentemente, da sua obra (Gn 1,4.10.12.18,
etc.). Na verdade, Jesus sempre desconfia dos elogios, certamente, por
experiência, pois quase todos episódios dos evangelhos que começam com elogios
terminam em conflito ou incompreensão. Este por exemplo, não termina bem,
embora fique comprovada, no final, a sinceridade daquele homem que perguntou
sobre o que fazer para ganhar a vida eterna. Por vida eterna nos evangelhos,
incluindo esta passagem, não se entende a realidade futura do pós-morte, mas a
vida neste mundo com sentido pleno. E, para todo bom judeu, o sentido da vida
dependia essencialmente da observação da Lei. Quem encontra sentido para a vida
aqui, eterniza a sua existência: essa vida se torna indestrutível, mesmo com a
morte.
É claro que
Jesus propõe a superação da mentalidade judaica predominante sobre o sentido da
vida. A observação dos mandamentos da Lei não é suficiente, aliás, já não
garante sentido algum, pois tudo agora depende da disposição de cada pessoa
acolher o amor de Deus que Jesus veio revelar, não por meio de doutrinas, mas
através do seu próprio jeito de amar. Por isso, ele responde àquele homem desta
maneira: «Tu conheces os mandamentos: não matarás; não cometerás adultério;
não roubarás; não levantarás falso testemunho; não prejudicarás ninguém; honra
teu pai e tua mãe» (v. 19). Jesus parte dos mandamentos como caminho
para chegar no coração da sua mensagem. Além do mais, deve-se recordar que a
observação dos mandamentos não faz mal, pelo contrário, faz bem. Mas é
necessário algo a mais, e muito mais, não como mero acréscimo, mas como
superação. Ele começa a interação com o homem a partir dos mandamentos porque
era o que havia em comum entre eles, naquele momento. É importante observar
quais os mandamentos que Jesus recorda: aqueles que dizem respeito ao modo de
relacionar-se com o próximo. O primeiro mandamento – amar a Deus sobre todas as
coisas – nem sequer é mencionado por Jesus aqui, porque ele compreende que se não há
respeito à dignidade do próximo e o reconhecimento dos direitos humanos, o amor
e o culto a Deus são falsos, não passam de demagogia. Não há culto agradável a
Deus se o ser humano não é respeitado em sua condição e dignidade. Por isso, Jesus apresenta os mandamentos que dizem respeito à relação com o próximo como
ponto de partida para o sentido da vida. É preciso recordar sempre: Jesus não
absolutiza os mandamentos aqui e em nenhuma ocasião, mas apresenta aqueles que
colocam o bem do próximo no centro como ponto de partida para uma vida
autêntica.
O homem responde
a Jesus afirmando já cumprir todos os mandamentos indicados por ele, como diz o
evangelista: «Ele respondeu: “Mestre, tudo isso tenho observado desde a
minha juventude”» (v. 20). Percebe-se aqui que não se tratava de uma
pessoa má intencionada que queria rivalizar com Jesus, ao contrário dos
fariseus, pois ele continua chamando Jesus de mestre, mesmo já tendo sido contrariado. Nessa resposta percebe-se
também que se trata de uma pessoa já adulta, madura, e não mais de um jovem,
como aparece na versão de Mateus. Portanto, para as versões de Marcos e de
Lucas é incorreto chamar esse texto de episódio do “jovem rico”. Essa denominação
é exclusiva de Mateus, o que terminou deixando a sua versão mais conhecida, pois os personagens adjetivados tendem a ganhar mais popularidade, ainda mais quando é um personagem sem nome. O que fica da sua identidade, para o leitor, é a adjetivação. Nesta
fala do homem, em resposta a Jesus, percebe-se já um certo cansaço na
observação da Lei. É como se ele cultivasse algo há bastante tempo, e não
colhesse os frutos desejados. É o esgotamento da Lei que vai se tornando cada
vez mais percebido. Tudo indica que aquele homem tinha depositado muita esperança
na observação da Lei, esperando ter suas necessidades existenciais
correspondidas a partir dela. A construção do texto faz perceber uma certa
decepção no homem, o que parece torná-lo carente de humanização e sentido. E
Jesus o acolhe muito bem em seu drama, sente-se solidário e propõe um caminho
de superação, como mostra a continuação do texto.
Com sua
atitude e nova resposta ao homem, Jesus se revela, como sempre, um verdadeiro mestre
de humanização: «Jesus olhou para
ele com amor, e disse: “Só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens e dá
aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me”» (v.
21). Essa é a única vez que o Evangelho de Marcos afirma que Jesus amou uma
pessoa em particular. E o diz empregando o verbo do amor máximo, pleno,
completo – em grego: ἀγαπάω - agapáo. É
claro que Jesus ama sempre e ama a todas as pessoas, indistintamente, mas
somente aqui o evangelista enfatizou. E amou olhando o homem profundamente,
olho no olho. É uma situação parecida com o que fez com a multidão faminta: viu
e teve compaixão (Mc 6,34). Porém, aqui, tudo é mais intenso. Ele olhou o homem fixamente e o
amou com o mesmo amor com o qual entregou-se. O amor gera relações fraternas e
sinceras, e a falta de correspondência no amor não faz Jesus amar menos. É
amando que Jesus revela a incompletude do ser humano, ao dizer que faltava algo
naquele homem, uma coisa que, na verdade, era tudo: livrar-se do seu mal –
equivalente à lepra que atormentava um homem ainda no início do Evangelho de
Marcos (1,40), e o fez ajoelhar-se diante de Jesus e pedir-lhe a cura. Ao
leproso suplicante ajoelhado, Jesus purificou-o, deu uma ordem e ele a cumpriu.
A este homem, Jesus dá uma ordem e ainda faz um convite: vender tudo o que
tem, dar aos pobres e segui-lo. Era a única coisa que faltava, mas era
tudo, ao mesmo tempo. De fato, ao dizer «uma só coisa te falta»,
não significa que faltava uma coisa a mais na vida daquele homem, tendo em
vista que ele já fazia muito, mas quer dizer que faltava o que é essencial, o
indispensável, o tudo.
E a lógica do
Reino contraria a lógica humana: o homem foi a Jesus para pedir, para ter algo
– a vida eterna –, Jesus diz que ele deve dar, abrir mão do que tinha; foi pedir sentido para a vida,
Jesus pede para livrar-se do que estava lhe tirando esse sentido: a riqueza, a
posse dos bens e o apego a esses. Isso mostra a insuficiência da ética dos
mandamentos, por isso, é necessário superá-la. É importante notar a sequência
das atitudes necessárias para dar sentido à existência, conforme a resposta de
Jesus ao homem rico: «vender, dar aos pobres e segui-lo». Como se vê, a
opção pelos pobres é condição para um seguimento autêntico de Jesus. Não
bastaria ao homem vender os bens; se bastasse vender, ele poderia fazê-lo para
depositar ou reter o dinheiro para si, poderia doar para familiares ou até
compartilhar com o grupo que já estava no seguimento de Jesus. Mas Jesus diz
que era necessário vender e dar aos pobres. Aqui, os pobres (em grego: πτωχός – ptokós) se tornam a categoria privilegiada de mediação entre Jesus e seus
seguidores. Dar aos pobres é a única forma
autêntica de partilha, de doação. É o gesto de gratuidade e desapego, por
excelência, porque é a certeza de que não se receberá nada em troca. Como
era muito rico, a reação do homem foi de tristeza: saiu abatido (v. 22), por causa da riqueza, não estava preparado para assimilar a
lógica do Reino. Mas é importante recordar a formulação da frase: o homem «ficou
abatido e foi embora cheio de tristeza, porque era muito rico» (v. 22). Com
muita clareza, o evangelista diz que a causa do abatimento e tristeza do homem foi
a riqueza. Como afirmado no início da reflexão, este episódio do encontro de
Jesus com o homem rico não termina em conflito, mas termina em tristeza. O homem
procurou Jesus com interesse e sinceridade, embora tenha lhe faltado coragem e
disposição para abraçar a proposta lançada.
Do confronto
com um personagem externo, Jesus se volta para o interior da comunidade (v. 23),
ou seja, para os seus discípulos, os mais necessitados de assimilar seus ensinamentos
para assumir a lógica do Reino na vida. Assim, diz o evangelista que «Os
discípulos se admiravam com estas palavras, mas ele disse de novo: “Meus
filhos, como é difícil entrar no Reino de Deus!”» (v. 24). Da
admiração dos discípulos, Jesus aproveita para aprofundar a catequese. Essa admiração
quer dizer que eles ainda não conheciam Jesus em profundidade, continuavam se
surpreendendo. Por isso, precisavam ficar cada vez mais atentos. As incompreensões
deles que o evangelista recorda com frequência são prova disso. Mas Jesus não
desiste deles. Nesta passagem, chama a atenção o fato de Jesus chamá-los de filhos
(em grego: τέκνα – tekna). Por sinal, em Marcos é a única vez os discípulos são chamados
assim. Nos evangelhos, a insistência sobre um mesmo argumento revela a sua
importância. Entrar no Reino de Deus é difícil, realmente, porque não há como
critérios os méritos pessoais, mas uma adesão incondicional à pessoa de Jesus e
sua mensagem. Esse Reino não é a vida futura, mas este mundo concreto,
organizado segundo a vontade de Deus, marcado por justiça, amor, solidariedade,
fraternidade e igualdade. Aceitar e aderir a essa dinâmica é mais difícil para
os ricos (v. 23), mas não é fácil para ninguém (v. 24), pois exige uma
conversão profunda, ou seja, uma mudança de mentalidade. Também os discípulos,
ao longo do caminho, mostravam dificuldades em aderir plenamente, à medida em
que alimentavam expectativas de poder e praticavam atos que distorciam o que
Jesus lhes ensinava: praticavam proselitismo (Mc 9,38-40), alimentavam
rivalidades entre si (Mc 9,33-37), impediam as crianças de se aproximarem de
Jesus (Mc 10,13-16), desejavam sucesso (Mc 10,35-40), etc.
Na
continuidade, com um provérbio hiperbólico, Jesus enfatiza a dificuldade para
os ricos assimilarem a lógica do Reino: «É mais fácil um camelo passar
pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus!» (v.
25). Muitas tentativas de explicação já surgiram para suavizar a dureza dessa
afirmação: algumas afirmavam que o “camelo”, aqui, seria um tipo de corda
grossa, outras que o “buraco da agulha” era uma porta estreita num muro de
Jerusalém, pela qual um camelo não conseguiria passar. Aceitar e alimentar tais
interpretações é ignorar a radicalidade do Evangelho. Se trata de uma
hipérbole, algo bem característico da linguagem de Jesus e do evangelista
Marcos. O camelo era o maior aninam conhecido na Palestina, enquanto o buraco
da agulha a menor abertura que se podia imaginar. Constituem, portanto, dois
exemplos ideais para quem tanto aprecia ensinar por meio de paradoxos e
comparações exageradas. Até que foram encontrados alguns manuscritos mais
recentes nos quais a palavra camelo (em grego: κάμηλος – kamelos) foi trocada
por outra muito parecida que, realmente, significa corda: kamilos (κάμιλος). Porém,
levando em conta os principais critérios da crítica textual, sobretudo a
antiguidade, a exegese concluiu que a troca dos termos se deu por opção dos copistas,
quando a ideia original da hipérbole já assustava muitas pessoas, principalmente
os ricos, tamanha a radicalidade expressa. Na exegese moderna já não há mais
duvida de que o camelo do provérbio é mesmo o animal, e o buraco da agulha
refere-se mesmo ao pequeno objeto do mundo do mundo da costura e tecelagem. Contudo,
ainda hoje existem perspectivas suavizadoras de interpretação, tanto para esta
quanto para outras afirmações impactantes de Jesus.
É claro que,
com uma afirmação dessas, os discípulos ficaram ainda mais perplexos, como
mostra o texto: «Eles ficaram muito espantados ao ouvirem isso, e
perguntavam uns aos outros: “Então, quem pode ser salvo?”» (v. 26).
Essa admiração é compreensível, porque, conforme a mentalidade da época, as
riquezas eram sinônimo de bênção de Deus. Vivia-se a religião dos méritos e uma
“teologia da prosperidade”. Quanto mais uma pessoa fosse rica, mais era
considerada abençoada por Deus. Por isso, a admiração dos discípulos com o que
Jesus dizia, pois ele desconstruía ideias basilares da teologia tradicional de
Israel. Em outras palavras, é como se os discípulos dissessem: “se um rico não
se salva, ninguém mais pode se salvar”. Ora, eles compartilhavam a mentalidade
corrente, tinham sido educados segundo a lógica do acúmulo e da busca por
poder, alimentados pela religião. Jesus tenta desconstruir essa mentalidade,
mostrando o contrário. Mas Jesus procura tranquilizá-los, dizendo: «Para
os homens isso é impossível, mas não para Deus. Para Deus tudo é possível» (v.
27). De fato, a história da salvação é marcada por diversos acontecimentos
impossíveis para a lógica humana, que se tornaram possíveis com a graça de
Deus: a gravidez de Sara, já estéril (Gn 18,14), a gravidez de Isabel, também
estéril (Lc 1,37) e de Maria, virgem (Lc 1,37). A dificuldade da salvação para
os ricos consiste na dificuldade que eles têm de assimilar a lógica do Reino,
abrindo mão do que possuem e distribuindo aos mais necessitados, os pobres;
isso é difícil sim, mas não impossível.
Diante de tudo
já isso, mais uma vez, Pedro fala em nome do grupo, inquieto com as exigências
do Reino e com as renúncias que já tinham feito até ali: «Pedro então
começou a dizer-lhe: “Eis que nós deixamos tudo e te seguimos”» (v.
28). Parece até oportunismo dos discípulos, como expresso nas palavras de
Pedro. Jesus sabia e conhecia o que eles já tinham deixado, desde o primeiro
encontro, às margens do mar da Galileia, quando os chamou e eles, realmente,
deixaram tudo para segui-lo (Mc 1,16-20). Ele não nega isso e responde de modo
solene, a fim de encorajá-los a continuar no seguimento: «Em verdade
vos digo, quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por
causa de mim e do Evangelho, receberá cem vezes mais agora, durante esta vida –
casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições – e, no futuro, a
vida eterna» (vv. 29-30). À medida em que as exigências aumentavam,
havia na comunidade uma tendência ao desânimo e, até mesmo, à desistência.
Contudo, Jesus não promete prêmios, nem recompensa, mas garante sentido para a
existência. Não obstante as perseguições, para os seus seguidores e seguidoras
é assegurada uma vida fraterna, uma vida comunitária real, desde que aceitem a
lógica do Reino, com as renúncias devidas. Aqui, Jesus faz um convite à
confiança na providência: quem deixa tudo por causa do Evangelho, não sente
falta de nada. Por isso, Ele repete as mesmas coisas que devem ser deixadas
como as mesmas que serão recebidas em abundância. O que é deixado como renúncia
é multiplicado como abundância. Abundância de sentido, obviamente. O homem rico
anônimo não estava pronto para assimilar essa lógica nova, de perder para poder
ganhar, mas os discípulos que já conviviam com Jesus há bastante tempo também
pareciam ainda não ter assimilado.
Para quem decide
entrar na dinâmica do Reino, tudo é ressignificado. “Casa, irmãos, irmãs, mães,
filhos e campos”, como recompensa, não são posses, mas sinais de uma comunidade
unida e perseverante, e frutos da partilha. É um ideal de vida que renasce. A
comunidade que vive, de fato, o espírito da partilha, tem tudo o que é
necessário, sem supérfluos, e se sustenta em relações fraternas. Porém, só
recebe quem, antes, dá; quem deixa para trás o que tem e se aventura na
dinâmica do Reino para herdar, com perseguição, o que dá sentido à vida. Quem
aceita essa dinâmica, tem a sua vida eternizada.
Pe. Francisco Cornelio F.
Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN
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