sábado, outubro 12, 2024

REFLEXÃO PARA O 28º DOMINGO DO TEMPO COMUM – MARCOS 10,17-30 (ANO B)



Na liturgia deste vigésimo oitavo domingo do tempo comum, continuamos a leitura sequenciada do Evangelho de Marcos. Inclusive, o texto de hoje – Mc 10,17-30 – é a continuação imediata daquele do domingo passado (Mc 10,2-16). Consequentemente, o contexto continua sendo o mesmo: o caminho de Jesus em direção à cidade de Jerusalém, com seus discípulos, que culminará com os eventos de sua paixão, morte e ressurreição. Durante esse percurso, que é mais um itinerário catequético e teológico do que geográfico, Jesus é interrompido diversas vezes, por várias categorias de interlocutores, que lhe fazem perguntas relevantes sobre a natureza e as condições para o discipulado, sobre as características do Reino de Deus e os critérios para desse fazer parte. Jesus é questionado, tanto por personagens externos, quanto pelos discípulos. Há interlocutores que interagem com interesse e seriedade, com vontade de aprender, enquanto há outros que o interrogam com malícia, esperando um deslize para acusá-lo de herege ou blasfemo e, assim, antecipar a sua condenação, como se viu no episódio do domingo passado, quando alguns fariseus lhe interromperam e interrogaram sobre a legitimidade do divórcio (Mc 10,2-16). Após respondê-los, sem cair na cilada, Jesus aprofundou o ensinamento do respectivo tema para os discípulos. No texto de hoje, embora o tema seja diferente, o esquema é o mesmo: Jesus é questionado por um personagem externo, com quem interage e, em seguida, pelos próprios discípulos. Trata-se de um episódio comum aos três evangélicos sinóticos (Mt 19,16-29; Mc 10,17-30; Lc 18,18-30), sendo que a versão de Marcos é a mais rica, por ser a mais original, embora a de Mateus tenha se tornado mais conhecida, como será recordado mais adiante, durante a explicação.

Uma vez que o contexto é o mesmo do domingo passado, não há necessidade nos prolongarmos na contextualização. Por isso, partimos para o estudo do texto, começando do primeiro versículo, no qual se diz que «Quando Jesus saiu a caminhar, veio alguém correndo, ajoelhou-se diante dele e perguntou: “Bom Mestre, que devo fazer para ganhar a vida eterna?”» (v. 17). Após uma pausa, o caminho foi retomado por Jesus e seus discípulos. Durante a pausa, eles estiveram em uma casa, como recordava a passagem lida no domingo passado (10,10), embora a localização geográfica não tenha sido fornecida. Certamente, já não era mais a casa de Cafarnaum que tinha servido de base de apoio para o ministério de Jesus na Galileia. À essa altura do caminho, eles já tinham saído da Galileia e estavam quase terminando de atravessar a Samaria, uma vez que já se aproximava da Judeia, onde ficava Jerusalém.  É importante recordar que a estrada – caminho – é o espaço privilegiado para o ensinamento, sobretudo em uma comunidade itinerante como a de Jesus e seus discípulos. Além de expressar a carência de estruturas fixas, o caminho expressa também o aspecto dinâmico, aberto e missionário da comunidade. O outro espaço privilegiado da catequese, sobretudo no Evangelho de Marcos, é a casa, como imagem da fraternidade. No caminho, Jesus e a comunidade estão expostos, qualquer pessoa pode interagir e questionar, como fez esse “alguém” que, veio correndo ao seu encontro e ajoelhou-se. Esse personagem é totalmente desconhecido, é anônimo. Pelo pouco que o texto diz dele, deve tratar-se de alguém muito necessitado de sentido para a vida, alguém inquieto, preocupado. Tanto é, que vai correndo ao encontro de Jesus; quer dizer que tem pressa de encontrar-se com ele.

Com a pressa para encontrar-se com Jesus, o homem anônimo demonstra reconhecer nele a fonte de sentido para a vida, ao mesmo tempo em que percebe a insuficiência da sua prática religiosa até então. Essa necessidade e reconhecimento se tornam ainda mais evidentes com a sua primeira atitude, após a carreira: ele «ajoelhou-se diante de Jesus». Até então, somente um personagem tinha se ajoelhado aos pés de Jesus, no Evangelho de Marcos: um leproso, ao suplicar-lhe a cura, logo no início do seu ministério (Mc 1,40). Isso quer dizer que também esse homem apressado possui uma enfermidade grave, até aqui desconhecida do leitor, mas em breve será revelada pelo narrador. Conhecedor profundo de Deus, o seu Pai, Jesus responde à interpelação daquele homem recordando que «Só Deus é bom, e mais ninguém» (v. 18). De fato, a bondade era um atributo de Deus e, consequentemente, da sua obra (Gn 1,4.10.12.18, etc.). Na verdade, Jesus sempre desconfia dos elogios, certamente, por experiência, pois quase todos episódios dos evangelhos que começam com elogios terminam em conflito ou incompreensão. Este por exemplo, não termina bem, embora fique comprovada, no final, a sinceridade daquele homem que perguntou sobre o que fazer para ganhar a vida eterna. Por vida eterna nos evangelhos, incluindo esta passagem, não se entende a realidade futura do pós-morte, mas a vida neste mundo com sentido pleno. E, para todo bom judeu, o sentido da vida dependia essencialmente da observação da Lei. Quem encontra sentido para a vida aqui, eterniza a sua existência: essa vida se torna indestrutível, mesmo com a morte.

É claro que Jesus propõe a superação da mentalidade judaica predominante sobre o sentido da vida. A observação dos mandamentos da Lei não é suficiente, aliás, já não garante sentido algum, pois tudo agora depende da disposição de cada pessoa acolher o amor de Deus que Jesus veio revelar, não por meio de doutrinas, mas através do seu próprio jeito de amar. Por isso, ele responde àquele homem desta maneira: «Tu conheces os mandamentos: não matarás; não cometerás adultério; não roubarás; não levantarás falso testemunho; não prejudicarás ninguém; honra teu pai e tua mãe» (v. 19). Jesus parte dos mandamentos como caminho para chegar no coração da sua mensagem. Além do mais, deve-se recordar que a observação dos mandamentos não faz mal, pelo contrário, faz bem. Mas é necessário algo a mais, e muito mais, não como mero acréscimo, mas como superação. Ele começa a interação com o homem a partir dos mandamentos porque era o que havia em comum entre eles, naquele momento. É importante observar quais os mandamentos que Jesus recorda: aqueles que dizem respeito ao modo de relacionar-se com o próximo. O primeiro mandamento – amar a Deus sobre todas as coisas – nem sequer é mencionado por Jesus aqui, porque ele compreende que se não há respeito à dignidade do próximo e o reconhecimento dos direitos humanos, o amor e o culto a Deus são falsos, não passam de demagogia. Não há culto agradável a Deus se o ser humano não é respeitado em sua condição e dignidade. Por isso, Jesus apresenta os mandamentos que dizem respeito à relação com o próximo como ponto de partida para o sentido da vida. É preciso recordar sempre: Jesus não absolutiza os mandamentos aqui e em nenhuma ocasião, mas apresenta aqueles que colocam o bem do próximo no centro como ponto de partida para uma vida autêntica.

O homem responde a Jesus afirmando já cumprir todos os mandamentos indicados por ele, como diz o evangelista: «Ele respondeu: “Mestre, tudo isso tenho observado desde a minha juventude”» (v. 20). Percebe-se aqui que não se tratava de uma pessoa má intencionada que queria rivalizar com Jesus, ao contrário dos fariseus, pois ele continua chamando Jesus de mestre, mesmo já tendo sido contrariado. Nessa resposta percebe-se também que se trata de uma pessoa já adulta, madura, e não mais de um jovem, como aparece na versão de Mateus. Portanto, para as versões de Marcos e de Lucas é incorreto chamar esse texto de episódio do “jovem rico”. Essa denominação é exclusiva de Mateus, o que terminou deixando a sua versão mais conhecida, pois os personagens adjetivados tendem a ganhar mais popularidade, ainda mais quando é um personagem sem nome. O que fica da sua identidade, para o leitor, é a adjetivação. Nesta fala do homem, em resposta a Jesus, percebe-se já um certo cansaço na observação da Lei. É como se ele cultivasse algo há bastante tempo, e não colhesse os frutos desejados. É o esgotamento da Lei que vai se tornando cada vez mais percebido. Tudo indica que aquele homem tinha depositado muita esperança na observação da Lei, esperando ter suas necessidades existenciais correspondidas a partir dela. A construção do texto faz perceber uma certa decepção no homem, o que parece torná-lo carente de humanização e sentido. E Jesus o acolhe muito bem em seu drama, sente-se solidário e propõe um caminho de superação, como mostra a continuação do texto.

Com sua atitude e nova resposta ao homem, Jesus se revela, como sempre, um verdadeiro mestre de humanização: «Jesus olhou para ele com amor, e disse: “Só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me”» (v. 21). Essa é a única vez que o Evangelho de Marcos afirma que Jesus amou uma pessoa em particular. E o diz empregando o verbo do amor máximo, pleno, completo – em grego: ἀγαπάω - agapáo. É claro que Jesus ama sempre e ama a todas as pessoas, indistintamente, mas somente aqui o evangelista enfatizou. E amou olhando o homem profundamente, olho no olho. É uma situação parecida com o que fez com a multidão faminta: viu e teve compaixão (Mc 6,34). Porém, aqui, tudo é mais intenso. Ele olhou o homem fixamente e o amou com o mesmo amor com o qual entregou-se. O amor gera relações fraternas e sinceras, e a falta de correspondência no amor não faz Jesus amar menos. É amando que Jesus revela a incompletude do ser humano, ao dizer que faltava algo naquele homem, uma coisa que, na verdade, era tudo: livrar-se do seu mal – equivalente à lepra que atormentava um homem ainda no início do Evangelho de Marcos (1,40), e o fez ajoelhar-se diante de Jesus e pedir-lhe a cura. Ao leproso suplicante ajoelhado, Jesus purificou-o, deu uma ordem e ele a cumpriu. A este homem, Jesus dá uma ordem e ainda faz um convite: vender tudo o que tem, dar aos pobres e segui-lo. Era a única coisa que faltava, mas era tudo, ao mesmo tempo. De fato, ao dizer «uma só coisa te falta», não significa que faltava uma coisa a mais na vida daquele homem, tendo em vista que ele já fazia muito, mas quer dizer que faltava o que é essencial, o indispensável, o tudo.

E a lógica do Reino contraria a lógica humana: o homem foi a Jesus para pedir, para ter algo – a vida eterna –, Jesus diz que ele deve dar, abrir mão do que tinha; foi pedir sentido para a vida, Jesus pede para livrar-se do que estava lhe tirando esse sentido: a riqueza, a posse dos bens e o apego a esses. Isso mostra a insuficiência da ética dos mandamentos, por isso, é necessário superá-la. É importante notar a sequência das atitudes necessárias para dar sentido à existência, conforme a resposta de Jesus ao homem rico: «vender, dar aos pobres e segui-lo». Como se vê, a opção pelos pobres é condição para um seguimento autêntico de Jesus. Não bastaria ao homem vender os bens; se bastasse vender, ele poderia fazê-lo para depositar ou reter o dinheiro para si, poderia doar para familiares ou até compartilhar com o grupo que já estava no seguimento de Jesus. Mas Jesus diz que era necessário vender e dar aos pobres. Aqui, os pobres (em grego: πτωχός – ptokós) se tornam a categoria privilegiada de mediação entre Jesus e seus seguidores. Dar aos pobres é a única forma autêntica de partilha, de doação. É o gesto de gratuidade e desapego, por excelência, porque é a certeza de que não se receberá nada em troca. Como era muito rico, a reação do homem foi de tristeza: saiu abatido (v. 22), por causa da riqueza, não estava preparado para assimilar a lógica do Reino. Mas é importante recordar a formulação da frase: o homem «ficou abatido e foi embora cheio de tristeza, porque era muito rico» (v. 22). Com muita clareza, o evangelista diz que a causa do abatimento e tristeza do homem foi a riqueza. Como afirmado no início da reflexão, este episódio do encontro de Jesus com o homem rico não termina em conflito, mas termina em tristeza. O homem procurou Jesus com interesse e sinceridade, embora tenha lhe faltado coragem e disposição para abraçar a proposta lançada.

Do confronto com um personagem externo, Jesus se volta para o interior da comunidade (v. 23), ou seja, para os seus discípulos, os mais necessitados de assimilar seus ensinamentos para assumir a lógica do Reino na vida. Assim, diz o evangelista que «Os discípulos se admiravam com estas palavras, mas ele disse de novo: “Meus filhos, como é difícil entrar no Reino de Deus!”» (v. 24). Da admiração dos discípulos, Jesus aproveita para aprofundar a catequese. Essa admiração quer dizer que eles ainda não conheciam Jesus em profundidade, continuavam se surpreendendo. Por isso, precisavam ficar cada vez mais atentos. As incompreensões deles que o evangelista recorda com frequência são prova disso. Mas Jesus não desiste deles. Nesta passagem, chama a atenção o fato de Jesus chamá-los de filhos (em grego: τέκνα – tekna). Por sinal, em Marcos é a única vez os discípulos são chamados assim. Nos evangelhos, a insistência sobre um mesmo argumento revela a sua importância. Entrar no Reino de Deus é difícil, realmente, porque não há como critérios os méritos pessoais, mas uma adesão incondicional à pessoa de Jesus e sua mensagem. Esse Reino não é a vida futura, mas este mundo concreto, organizado segundo a vontade de Deus, marcado por justiça, amor, solidariedade, fraternidade e igualdade. Aceitar e aderir a essa dinâmica é mais difícil para os ricos (v. 23), mas não é fácil para ninguém (v. 24), pois exige uma conversão profunda, ou seja, uma mudança de mentalidade. Também os discípulos, ao longo do caminho, mostravam dificuldades em aderir plenamente, à medida em que alimentavam expectativas de poder e praticavam atos que distorciam o que Jesus lhes ensinava: praticavam proselitismo (Mc 9,38-40), alimentavam rivalidades entre si (Mc 9,33-37), impediam as crianças de se aproximarem de Jesus (Mc 10,13-16), desejavam sucesso (Mc 10,35-40), etc.

Na continuidade, com um provérbio hiperbólico, Jesus enfatiza a dificuldade para os ricos assimilarem a lógica do Reino: «É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus!» (v. 25). Muitas tentativas de explicação já surgiram para suavizar a dureza dessa afirmação: algumas afirmavam que o “camelo”, aqui, seria um tipo de corda grossa, outras que o “buraco da agulha” era uma porta estreita num muro de Jerusalém, pela qual um camelo não conseguiria passar. Aceitar e alimentar tais interpretações é ignorar a radicalidade do Evangelho. Se trata de uma hipérbole, algo bem característico da linguagem de Jesus e do evangelista Marcos. O camelo era o maior aninam conhecido na Palestina, enquanto o buraco da agulha a menor abertura que se podia imaginar. Constituem, portanto, dois exemplos ideais para quem tanto aprecia ensinar por meio de paradoxos e comparações exageradas. Até que foram encontrados alguns manuscritos mais recentes nos quais a palavra camelo (em grego: κάμηλος – kamelos) foi trocada por outra muito parecida que, realmente, significa corda: kamilos (κάμιλος). Porém, levando em conta os principais critérios da crítica textual, sobretudo a antiguidade, a exegese concluiu que a troca dos termos se deu por opção dos copistas, quando a ideia original da hipérbole já assustava muitas pessoas, principalmente os ricos, tamanha a radicalidade expressa. Na exegese moderna já não há mais duvida de que o camelo do provérbio é mesmo o animal, e o buraco da agulha refere-se mesmo ao pequeno objeto do mundo do mundo da costura e tecelagem. Contudo, ainda hoje existem perspectivas suavizadoras de interpretação, tanto para esta quanto para outras afirmações impactantes de Jesus.

É claro que, com uma afirmação dessas, os discípulos ficaram ainda mais perplexos, como mostra o texto: «Eles ficaram muito espantados ao ouvirem isso, e perguntavam uns aos outros: “Então, quem pode ser salvo?”» (v. 26). Essa admiração é compreensível, porque, conforme a mentalidade da época, as riquezas eram sinônimo de bênção de Deus. Vivia-se a religião dos méritos e uma “teologia da prosperidade”. Quanto mais uma pessoa fosse rica, mais era considerada abençoada por Deus. Por isso, a admiração dos discípulos com o que Jesus dizia, pois ele desconstruía ideias basilares da teologia tradicional de Israel. Em outras palavras, é como se os discípulos dissessem: “se um rico não se salva, ninguém mais pode se salvar”. Ora, eles compartilhavam a mentalidade corrente, tinham sido educados segundo a lógica do acúmulo e da busca por poder, alimentados pela religião. Jesus tenta desconstruir essa mentalidade, mostrando o contrário. Mas Jesus procura tranquilizá-los, dizendo: «Para os homens isso é impossível, mas não para Deus. Para Deus tudo é possível» (v. 27). De fato, a história da salvação é marcada por diversos acontecimentos impossíveis para a lógica humana, que se tornaram possíveis com a graça de Deus: a gravidez de Sara, já estéril (Gn 18,14), a gravidez de Isabel, também estéril (Lc 1,37) e de Maria, virgem (Lc 1,37). A dificuldade da salvação para os ricos consiste na dificuldade que eles têm de assimilar a lógica do Reino, abrindo mão do que possuem e distribuindo aos mais necessitados, os pobres; isso é difícil sim, mas não impossível.

Diante de tudo já isso, mais uma vez, Pedro fala em nome do grupo, inquieto com as exigências do Reino e com as renúncias que já tinham feito até ali: «Pedro então começou a dizer-lhe: “Eis que nós deixamos tudo e te seguimos”» (v. 28). Parece até oportunismo dos discípulos, como expresso nas palavras de Pedro. Jesus sabia e conhecia o que eles já tinham deixado, desde o primeiro encontro, às margens do mar da Galileia, quando os chamou e eles, realmente, deixaram tudo para segui-lo (Mc 1,16-20). Ele não nega isso e responde de modo solene, a fim de encorajá-los a continuar no seguimento: «Em verdade vos digo, quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e do Evangelho, receberá cem vezes mais agora, durante esta vida – casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições – e, no futuro, a vida eterna» (vv. 29-30). À medida em que as exigências aumentavam, havia na comunidade uma tendência ao desânimo e, até mesmo, à desistência. Contudo, Jesus não promete prêmios, nem recompensa, mas garante sentido para a existência. Não obstante as perseguições, para os seus seguidores e seguidoras é assegurada uma vida fraterna, uma vida comunitária real, desde que aceitem a lógica do Reino, com as renúncias devidas. Aqui, Jesus faz um convite à confiança na providência: quem deixa tudo por causa do Evangelho, não sente falta de nada. Por isso, Ele repete as mesmas coisas que devem ser deixadas como as mesmas que serão recebidas em abundância. O que é deixado como renúncia é multiplicado como abundância. Abundância de sentido, obviamente. O homem rico anônimo não estava pronto para assimilar essa lógica nova, de perder para poder ganhar, mas os discípulos que já conviviam com Jesus há bastante tempo também pareciam ainda não ter assimilado.

Para quem decide entrar na dinâmica do Reino, tudo é ressignificado. “Casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos”, como recompensa, não são posses, mas sinais de uma comunidade unida e perseverante, e frutos da partilha. É um ideal de vida que renasce. A comunidade que vive, de fato, o espírito da partilha, tem tudo o que é necessário, sem supérfluos, e se sustenta em relações fraternas. Porém, só recebe quem, antes, dá; quem deixa para trás o que tem e se aventura na dinâmica do Reino para herdar, com perseguição, o que dá sentido à vida. Quem aceita essa dinâmica, tem a sua vida eternizada.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

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