sábado, agosto 30, 2025

REFLEXÃO PARA O 22º DOMINGO DO TEMPO COMUM – LUCAS 14,1.7-14 (ANO C)



Dando sequência à leitura semicontínua do Evangelho de Lucas, como é próprio do ciclo litúrgico C, a liturgia deste vigésimo segundo domingo do tempo comum continua nos situando no contexto do longo caminho de Jesus, acompanhado de seus discípulos e discípulas, em direção à cidade de Jerusalém, onde consumará a sua missão com a paixão, morte e ressurreição. Como temos insistido ao longo dos domingos, esse caminho é, mais do que um percurso físico-geográfico, um itinerário catequético e um programa formativo, além de ser também uma metáfora da própria vida e uma imagem da comunidade cristã, ou seja, da Igreja, denominada explicitamente de “Caminho”, no livro dos Atos dos Apóstolos, o segundo volume da obra lucana. Trata-se, portanto, de uma criação do evangelista Lucas, que selecionou os mais importantes ensinamentos de Jesus e distribuiu-os nesta longa seção narrativa, composta de dez capítulos (Lc 9–19). Por isso, não consiste apenas no ato de caminhar, mas no ensinamento dos valores do Reino de Deus, sendo que Jesus é o próprio Reino em pessoa, de modo que tais valores se manifestam na sua maneira de agir diante das mais diversas situações.

Enquanto caminhava, Jesus se servia das mais diversas situações do cotidiano para instruir o povo e formar os seus discípulos e discípulas. A passagem selecionada para a liturgia de hoje – Lc 14,1.7-14 – apresenta Jesus numa refeição festiva do dia de sábado, na casa de um fariseu. A refeição, para todas as culturas antigas, possuía um valor sagrado; na cultura judaica era, acima de tudo, um momento de memória e de rendimento de graças a Deus por suas obras em favor de Israel, ao longo da história, principalmente a libertação da escravidão do Egito. No mundo greco-romano, que o evangelista Lucas conhecia muito bem, a refeição era também ocasião de ensino e aprendizado, através dos diálogos travados entre os comensais, de modo que o banquete se tornou um elemento importante para a filosofia grega, considerado, inclusive, um gênero literário próprio. No evangelho de hoje, Lucas procura conciliar e sintetizar as duas perspectivas. Por sinal, é exatamente Lucas o evangelista que mais apresenta Jesus sendo convidado e aceitando convites para participar de refeições, utilizando, assim, a comensalidade como ocasião de ensinamento (Lc 5,29-39; 7,36-50; 11,37-54; 19,5-6), além das refeições pascais de antes e depois da ressurreição (Lc 22,14-23; 24,41-43). Por isso, Lucas é conhecido também como o evangelista da comensalidade. Ao prezar tanto por mostrar Jesus entrando nas casas das pessoas para comer, ele reforça a imagem de um messias mais próximo das pessoas, sendo a visita definitiva de Deus à humanidade, espalhando misericórdia por onde passa. Das refeições de Jesus que Lucas descreve, três foram em casa de fariseus (Lc 7,36ss; 11,37ss; 14,1ss), sendo a de hoje a última. Por sinal, sempre havia conflito quando Jesus comia na casa de um fariseu. O trecho selecionado salta alguns versículos (vv. 2-6), os quais contêm uma cena também polêmica, na qual Jesus questiona o real valor do sábado, ao curar um enfermo hidrópico, mas esse salto não compromete a compreensão do texto, pois o foco da liturgia é o comportamento no banquete, tanto dos convidados quanto do anfitrião, como veremos.

Feitas as devidas observações a nível de contexto, voltemos a atenção para o texto, começando pelo primeiro versículo: «Aconteceu que, num dia de sábado, Jesus foi comer na casa de um dos chefes dos fariseus. E eles o observavam» (v. 1). Nos dias de sábado, após o culto matinal da sinagoga, as famílias almoçavam festivamente; a comida tinha sido preparada na véspera, a sexta-feira, o “dia da preparação”, como eles chamavam, uma vez que nenhum trabalho poderia ser feito no sábado, dia de culto e repouso. Nos povoados, os judeus mais influentes costumavam oferecer verdadeiros banquetes, convidando com frequência o pregador daquele dia na sinagoga, de modo que o almoço se transformava numa extensão do culto. Assim, à mesa, se discutia o assunto da pregação, aproveitando o espaço para se tirar as dúvidas, fazer esclarecimentos e até propor novas possibilidades de interpretação. Tudo isso faz supor que, naquele sábado, Jesus pregou na sinagoga do lugar por onde passava e, após o culto, recebeu o convite para uma refeição na casa de um fariseu ilustre, alguém importante do lugar. De fato, o evangelista não se refere ao anfitrião de Jesus apenas como um fariseu, mas como um “chefe” (em grego: ἄρχων) deles. Como a fama de Jesus já tinha se espalhado bastante, os primeiros interessados em conferir o teor de sua mensagem eram os fariseus, como guardiães da reta doutrina na época. Além de Jesus, o anfitrião de Jesus tinha outros convidados à mesa, certamente, outros fariseus, seus colegas de doutrina. E eles “observavam” Jesus. Com esse detalhe, que não é novidade para o leitor, o evangelista denuncia qual era a intenção deles com o convite: observar cuidadosamente os gestos e as palavras de Jesus, para o acusarem de blasfemo e transgressor da Lei de Deus, uma vez que a interpretação de Jesus geralmente trazia elementos novos que eles não aceitavam, pois ele colocava o bem e o serviço à vida acima de qualquer doutrina e norma.

Porém, pela continuidade do texto, podemos dizer que havia uma dupla malícia em ocasiões como essa: os fariseus convidavam Jesus para observá-lo e depois acusá-lo, e Jesus aceitava tais convites para desmascará-los, muito mais do que para desfrutar da fartura do banquete, como evidencia o próprio texto: «Jesus notou como os convidados escolhiam os primeiros lugares. Então, contou-lhes uma parábola» (v. 7). Como se vê, também Jesus observava os que estavam à mesa com ele. E, com base em suas observações, ele faz sérias advertências, tanto aos convidados, quanto ao anfitrião, especificamente sobre a humildade (vv. 8-11) e a generosidade-gratuidade (vv. 12-14). Destas advertências a pessoas específicas, que na cena descrita eram os fariseus, surge um ensinamento universal, direcionado inicialmente aos discípulos de primeira hora, mas estendido aos cristãos de todos os tempos: o cultivo da humildade e da gratuidade nas relações, ou seja, um estilo de vida baseado em novos critérios, em discordância com os valores defendidos pelas tradições ultrapassadas e excludentes da sociedade e da religião da época.

Ao advertir os convidados (vv. 8-11), Jesus recorre à tradição sapiencial e constrói uma pequena parábola, baseada em uma citação do livro dos Provérbios: «Não te vanglories na frente do rei, nem ocupes o lugar dos grandes; pois é melhor que te digam: “Sobe aqui!” do que seres humilhado na frente de um nobre» (Pr 25,6-7). Ora, tendo notado que os convidados escolhiam os primeiros lugares, demonstrando um notório espírito de competição, foi muito oportuna a chamada de atenção. A princípio, a recomendação de Jesus parece um convite à esperteza: como lograr sucesso na frente dos demais e ser promovido, passando do último para o primeiro lugar (v. 10). Era essa a mentalidade do autor sapiencial. Mas, Jesus usou o texto de Provérbios apenas como ilustração. O que, de fato, ele quer apresentar é a dinâmica do Reino de Deus e, ao mesmo tempo, prevenir seus discípulos para não imitarem o comportamento dos fariseus que ele tanto combatia. Por isso mesmo, ele continuará essa observação em outras ocasiões: na parábola do fariseu e o publicano (Lc 18,9-14) e, já em Jerusalém, no discurso contra os escribas (Lc 20,45-47).

Portanto, a intenção principal, tanto de Jesus quanto do evangelista, é a formação dos discípulos. Ora, a busca pelos primeiros lugares, característica do grupo dos fariseus, não pode fazer parte do discipulado de Jesus. A atitude do cristão deve ser sempre a do serviço, e quem serve não pensa nos lugares de honra, mas nas necessidades do próximo. Certamente, esse texto reflete também a preocupação de Lucas com a tendência hierarquizante nas suas comunidades, que passavam por um processo de institucionalização. O banquete dos fariseus é, aqui, apresentado como o antimodelo em relação ao banquete cristão, o qual deve prefigurar o banquete do Reino. Assim, renunciar aos lugares de destaque é, mais do que humildade, um gesto de amor. É dar espaço para o outro, optando por um modelo de sociedade alternativa, renunciando a qualquer indício de concorrência e egoísmo. É uma atitude inclusiva, como será desenvolvido na sequência do texto. Escolher o “último lugar” (em grego: ἔσχατος τόπος – eskátos tópos) significa estar completamente alinhado às opções de Deus, claramente reveladas na vida de Jesus, desde o nascimento na manjedoura até a morte na cruz. De fato, manjedoura e cruz sintetizam uma vida toda voltada para os últimos. Entre esses dois lugares, Jesus viveu entre os últimos e buscou-os, tomando-os como suas companhias prediletas. Por conseguinte, a escolha pelos últimos lugares recomendada por Jesus indica a opção pelos últimos enquanto pessoas marginalizadas, excluídas. Trata-se, acima de tudo, de assimilar a lógica do Reino que subverte toda a lógica da meritocracia, amparada pela sociedade e a religião da época de Jesus. A inversão de valores que Jesus propõe é caminho de humanização.

A segunda advertência de Jesus é dirigida ao anfitrião, e completa a primeira, afinal, convidados e anfitrião refletiam e representavam os mesmos modelos de sociedade e religião da época, ambas antagônicas ao Reino de Deus que ele veio apresentar. Eis o que diz o texto: «E (Jesus) disse também a quem o tinha convidado: “Quando tu deres um almoço ou um jantar, não convides teus amigos, nem teus irmãos, nem teus parentes, nem teus vizinhos ricos. Pois estes poderiam também convidar-te e isto já seria a tua recompensa. Pelo contrário, quando deres uma festa, convida os pobres, os aleijados, os coxos, os cegos”» (vv. 12-13). Ora, tendo antes observado como «os convidados escolhiam os primeiros lugares» (v. 7a), ele percebeu também as características destes convidados, e os critérios empregados pelo dono da casa para convidá-los. Estava muito clara a lógica da retribuição naquele ambiente. Aqui, ele retoma o discurso das bem-aventuranças: «fazei o bem e emprestai sem esperar nada em troca» (Lc 6,35). Por sinal, todo esse episódio está alinhado à lógica das bem-aventuranças e do Magnificat, que constituem completa subversão à lógica vigente. Esse conselho dado ao dono da casa é completamente contrário aos costumes da época. Trata-se de algo revolucionário. O convite à generosidade e à gratuidade nas relações é, aqui, apenas um dos ricos significados desse trecho. Fazer o bem sem esperar recompensa é, de fato, uma atitude necessária para a comunidade dos discípulos e uma exigência para a construção do Reino, como alternativa ao modelo de sociedade daquela época e de hoje. Aquilo que Jesus recomenda ao anfitrião não é apenas um conselho, mas representa um modelo novo de sociedade, um ideal de mundo. Há um forte apelo a uma verdadeira revolução social, ao conceber as novas relações, e um convite para uma luta da qual nenhum cristão pode fugir: a superação de todas as formas de exclusão, marginalização e desigualdade.

Jesus observou, naquele ambiente, quatro categorias de convidados: «amigos, irmãos, parentes e vizinhos ricos» (v. 12); todas estas categorias tinham capacidade de retribuir o convite, e parece que já o faziam com bastante frequência. Para superar essa situação, que refletia uma mentalidade e teologia retributivas, Jesus propõe outros critérios, sendo o primeiro deles a impossibilidade de retribuição. Por isso, sugere também quatro categorias como convidados ideais: «os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos» (v. 13). É aqui onde se encontra a máxima da novidade de Jesus neste episódio. Ora, é inegável que a religião dos judeus pregava uma atenção especial aos pobres, juntamente com os órfãos e as viúvas, sobretudo nos livros proféticos; mas a prioridade aos «aleijados, coxos e cegos» é uma grande novidade, sendo exclusividade de Jesus; essa atenção é fruto do seu amor infinito pelos últimos. Inclusive, de acordo com a Lei, quem fosse portador de qualquer deficiência física, incluindo cegos, coxos e aleijados, não podia sequer entrar no templo (Lv 21,18-20); logo, eram pessoas extremamente excluídas. E, de repente, Jesus diz que estas categorias devem ser as convidadas principais do banquete, contrariando a mentalidade da sociedade e da religião da época.

Para aquele fariseu e seus convidados, o que Jesus disse foi apenas uma sugestão. Para os cristãos, isso é compromisso e exigência: não há vida cristã sem luta pela inclusão e pela superação de todas as formas de discriminação e preconceitos. Ora, naquele banquete, Jesus viu uma miniatura da sociedade e da religião do seu tempo, marcadas pela competição e a lógica da retribuição. Por isso, ele investiu tanto nas críticas, apresentando também a proposta ideal de superação, ao combater a competição com a humildade e a retribuição com a gratuidade e a inclusão dos marginalizados. É interessante observar a fórmula “quatro por quatro”: tirar os privilégios de quatro grupos específicos, e incluir quatro grupos que representam todas as categorias de pessoas excluídas e marginalizadas, inclusive da vida religiosa, uma vez que os aleijados, os coxos e os cegos nem entrar no templo podiam. Assim, o projeto do Reino, anunciado no Evangelho de Lucas, logo no cântico de Maria, prevendo a ascensão dos humildes e a queda dos poderosos (Lc 1,52), vai ficando cada vez mais claro.

Não podemos deixar de perceber aqui uma antecipação da Eucaristia e seu sentido mais profundo: banquete para todos, motivado por amor-doação, sem exclusão alguma. Na conclusão, Jesus proclama uma bem-aventurança destinada a quem aceitar o seu projeto de inversão de ordem nas estruturas e nos costumes exclusivistas, conservados pela religião e a sociedade da época: «Então, tu serás feliz! Porque eles não te podem retribuir. Tu receberás a recompensa na ressurreição dos justos» (v. 14). É feliz quem assimila a lógica do Reino. A única recompensa para quem acolhe os mais necessitados, e excluídos em geral, é a certeza do amor de Deus em demasia. A expressão “ressurreição dos justos”, aqui, não é uma definição doutrinal, mas significa uma relação tão íntima com Deus que nem a morte consegue interromper. E, aquilo que garante essa relação é o amor e a solicitude para com os mais necessitados. Por isso, é necessário repensar, questionar e até reconfigurar, se for necessário, o banquete cristão, que é a Eucaristia. Se não ajuda a superar as exclusões e desigualdades do mundo, está longe de ser a ceia do Senhor.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

 

sexta-feira, agosto 22, 2025

REFLEXÃO PARA O 21º DOMINGO DO TEMPO COMUM – LUCAS 13,22-30 (ANO C)



Neste vigésimo primeiro domingo do tempo comum, a liturgia retoma a leitura semi-contínua do Evangelho de Lucas, interrompida no domingo passado, para a celebração da Solenidade da Bem-aventurada virgem Maria, na qual também se empregou um texto lucano, porém, não fazia parte da sequência em curso, própria do tempo comum. Com a retomada, após a interrupção, a necessidade de recordar o contexto se torna ainda mais evidente. E, providencialmente, desta vez, o contexto é fornecido pela própria passagem do evangelho – Lc 13,22-30 –, logo em seu primeiro versículo, o que torna desnecessária uma contextualização introdutória mais ampla como costumamos fazer, uma vez que essa será feita na explicação mesma do texto. Por isso, podemos já olhar diretamente para ele, que começa com a seguinte afirmação: «Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e prosseguindo o caminho para Jerusalém» (v. 22). Como se vê, o contexto continua sendo o do caminho de Jesus para Jerusalém, acompanhado por seus discípulos e discípulas. Como o caminho constitui a seção narrativa mais longa de todo o seu Evangelho (Lc 9–19), Lucas faz questão de recordar esse detalhe, de vez em quando, para situar o leitor e evitar possíveis dispersões. De fato, ele não quer que o leitor esqueça qual é a posição de Jesus, quais as suas atitudes, a fim de orientar os seus discípulos a fazerem o mesmo que faz o Mestre, colocando-se em caminho. Com isso, Lucas revela suas qualidades de narrador exemplar, que sabe prender a atenção dos seus leitores, demonstrando também ser um excelente catequista e formador.

Além de nos situar no contexto, o primeiro versículo também aponta para a natureza do caminho percorrido por Jesus: se trata de um itinerário catequético, sobretudo, muito mais do que um percurso geográfico. Enquanto caminha, ele ensina e forma o seu discipulado. Ao dizer que «Jesus atravessava cidades e povoados ensinando», o evangelista prefigura a natureza missionária e itinerante da Igreja, indicando que ela deve estar constantemente em saída. Enquanto caminhava e ensinava, Jesus se relacionava com as pessoas, ajudando-as a encontrar sentido para a vida. Ele promovia encontros e seus encontros eram transformadores. Por onde passava, ele deixava rastros, mediante o seu amor humanizante e sua misericórdia libertadora. Seu ensinamento impressionava pelo conteúdo e pela sua maneira de ensinar, por isso, despertava curiosidade em pessoas anônimas e desconhecidas que aproveitavam para lhe fazer perguntas, como mostram os evangelhos, principalmente o de Lucas, na seção narrativa do caminho. Tudo revela o quanto Jesus era uma pessoa acessível e aberta, que escutava a todos, sabia fazer-se próximo, não se deixando aprisionar por círculos e grupos restritos. Temos neste primeiro versículo, portanto, uma verdadeira síntese da vida e missão de Jesus, um verdadeiro peregrino da esperança. De fato, ao atravessar cidades e povoados ensinando, ele semeava esperança nas pessoas.

Na sequência, o evangelista diz que «Alguém lhe perguntou: “Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?”» (v. 23). Como se vê, trata-se de um interlocutor anônimo quem interpela Jesus, um papel que pode ser assumido por qualquer discípulo ou leitor do Evangelho de Lucas, independentemente da época. Isso revela também a abertura de Jesus: toda pessoa pode ter contato com ele, dirigir-se pessoalmente. E, Ressuscitado, ele continua assim: acessível, aberto. É muito provável que essa pergunta tenha sido motivada por algum ensinamento anterior de Jesus; provavelmente esta pessoa estava ouvindo sua pregação e teve essa curiosidade. Se trata de uma pergunta que reflete um pensamento e uma preocupação muito difundida nos ambientes judaicos do tempo de Jesus e, posteriormente, também no cristianismo. Ora, nas escolas rabínicas da época, circulavam três correntes principais que apresentavam diferentes respostas para uma pergunta desse tipo: uma primeira, afirmava que todos os judeus, pelo simples fato de pertencerem ao povo eleito, estavam automaticamente com a salvação garantida; uma segunda, pregava que não bastava fazer parte do povo eleito, mas era necessário observar a Lei de modo impecável e, por isso, somente um pequeno “resto de Israel” se salvaria; havia ainda uma terceira via: todos os judeus se salvariam e também os pagãos que aceitassem viver conforme a Lei poderiam se salvar.

Como de costume, Jesus não responde objetivamente ao seu interlocutor, mas lhe faz um convite ao esforço, à perseverança e à reflexão, através de uma pequena parábola, introduzida com a imagem da porta estreita: «Fazei todo o esforço possível para entrar pela porta estreita. Porque eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão» (v. 24). Embora neste contexto esteja aplicada a uma casa, essa imagem da porta estreita faz referência a uma pequena abertura que havia nos muros das cidades antigas. Como as cidades eram muradas, nos muros havia uma grande porta para entrada e saída de pessoas e transportes que, por motivos de segurança, era fechada à certa hora da noite e só se abria no dia seguinte. Próximo à grande porta, geralmente, havia uma pequena abertura, chamada de “porta estreita”, suficiente para a entrada de apenas uma pessoa por vez, e ainda com dificuldades, usada por quem não conseguisse chegar antes que a grande porta fechasse ou que necessitasse sair antes da abertura, no dia seguinte. Algumas pessoas não conseguiam passar por ela, tendo que ficar expostas aos perigos do lado de fora. Essa imagem era muito aplicada na antiguidade para referir-se a coisas difíceis que exigiam esforço e às situações de perigo.

Aplicada a uma casa, ao invés de uma cidade, a imagem da porta estreita perde um pouco do seu sentido, mas sendo usada por Jesus, neste contexto específico da resposta ao interlocutor desconhecido, funciona muito bem. Ora, o que está em questão é o acesso à salvação, ou seja, ao Reino de Deus, e isto depende do acolhimento à Boa Nova de Jesus na vida da pessoa, com todas as suas consequências. Um pouquinho antes de iniciar o caminho para Jerusalém (Lc 9,51), os discípulos tinham discutido entre si sobre quem era o maior entre eles; ao repreendê-los, Jesus tomou uma criança junto de si e apresentou-a como exemplo, dizendo que é necessário fazer-se pequeno para acolher a sua mensagem (Lc 9,46-47). A imagem da porta estreita é, portanto, uma retomada dessa temática e uma nova advertência aos discípulos, já que somente as pessoas pequenas passavam com facilidade pela “porta estreita”. É importante, recordar que, na dinâmica do caminho, mesmo quando Jesus entra em contato com outros personagens, os destinatários principais dos seus ensinamentos são sempre os discípulos, já que o caminho é, sobretudo, uma metáfora do seu programa formativo. Assim, Ele propõe mais uma vez a necessidade de fazer-se pequeno para lhe pertencer. Temos aqui, portanto, mais uma demonstração excepcional das qualidades pedagógicas de Jesus, que é a própria porta de acesso ao Reino de Deus. Passa por ele quem a ele se configura, assimilando seus ensinamentos e seu jeito de viver. Isso exige mesmo muito esforço, mas não sentido da meritocracia da lógica do mercado. Trata-se, acima de tudo, de assumir uma vida que se doa constantemente, como fez ele, irradiando amor e semeando justiça por onde passa.

O acesso ao Reino definitivo exige esforço e compromisso. Por isso, ao invés de dar uma resposta direta e exata ao interlocutor, Jesus fez um alerta para a necessidade de aderir ao programa do Reino, antes que seja tarde demais. Eis a continuação da parábola: «Uma vez que o dono da casa se levantar e fechar a porta, vós, do lado de fora, começareis a bater, dizendo: “Senhor, abre-nos a porta!” Ele responderá: “Não sei de onde sois”. Então começareis a dizer: “Nós comemos e bebemos diante de ti, e tu ensinaste em nossas praças”. Ele, porém, responderá: “Não sei de onde sois. Afastai-vos de mim todos que praticais a injustiça!”» (vv. 25-27). Embora seja apresentado um dono de casa severo, o centro do ensinamento aqui não é a sua severidade, mas uma demonstração daquilo que conta e o que não conta para alguém fazer parte do Reino. Logo, não temos aqui um anúncio de condenação ou castigo, mas uma advertência sobre as credenciais para ter as portas do Reino abertas. Antes de tudo, Jesus diz que não é suficiente ter comido e bebido com ele e nem ouvir o ensinamento, se tais atitudes não se traduzem em prática de justiça. Na época da redação do Evangelho, a celebração fraterna da fração do pão, versão primitiva da atual Eucaristia, já estava consolidada e, temos aqui uma chamada de atenção para quem não concilia essa celebração com uma conduta ética e justa na vida cotidiana. Em outras palavras, o acesso ao Reino não depende das práticas cultuais. Quem é praticante de injustiças está automaticamente excluído do Reino, mesmo que seja frequentador assíduo das mais variadas expressões cultuais, incluindo a celebração eucarística.

A exclusão do Reino corresponde a uma vida sem sentido, e não propriamente a um castigo: «Ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes Abraão, Isaac e Jacó, junto com todos os profetas no Reino de Deus, e vós, porém, sendo lançados fora» (v. 28). Essa linguagem ameaçadora, tão frequente em Mateus, é rara em Lucas, o evangelista da misericórdia; ele a emprega aqui por fidelidade à fonte utilizada. O choro e o ranger de dentes é uma contraposição à alegria e a paz, características básicas da comunidade do Reino, sobretudo na perspectiva de Lucas. Embora o foco de Jesus e do evangelista seja a construção da comunidade do Reino, temos aqui também uma clara crítica e denúncia às pretensões de exclusivismo do povo judeu em relação ao acesso à salvação, o que fica evidente pela seguinte afirmação: «Virão homens do Oriente e do Ocidente, do norte e do sul, e tomarão lugar à mesa no Reino de Deus» (v. 29). Como o que garante o acesso ao Reino é a vivência da justiça e, por outro lado, o que exclui é prática da injustiça, podem participar da mesa do Reino pessoas dos quatro cantos da terra, desde que abracem o programa de vida de Jesus e sejam adeptos da justiça. Pertencer a uma raça ou a uma religião não determina a pertença ou exclusão do Reino de Deus; o que conta é a conduta justa.

A conclusão é uma máxima proverbial que mostra que os critérios de Deus não seguem à lógica humana: «E assim há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos» (v. 30). Embora essa afirmação não seja exclusividade do Evangelho segundo Lucas, ela se encaixa muito bem na sua teologia que prevê, desde o início, uma inversão completa de ordem e de valores (Lc 2,51-52). Funciona também como uma chamada de atenção aos judeus que imaginavam ter prioridade no Reino pelo simples fato de fazerem parte do povo eleito. Hoje, o mesmo pensamento pode ser aplicado também a muitos seguimentos do cristianismo que imaginam ter prioridade no Reino apenas pela pertença ou assiduidade em certas práticas religiosas. O critério autêntico de pertença a Jesus e seu Reino é e será sempre a vivência da justiça. Obviamente, não se trata da justiça retributiva, mas a justiça emanada do amor.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

 

sexta-feira, agosto 15, 2025

REFLEXÃO PARA A SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DE MARIA (LUCAS 1,39-56)



Neste ano, a liturgia do vigésimo domingo do tempo comum é substituída pela solenidade da Assunção de Maria, repetindo o que aconteceu no ano passado. Como se sabe, independentemente do ano litúrgico em curso, o evangelho desta festa é sempre o mesmo: Lc 1,39-56. Trata-se de um dos textos mais conhecidos do Evangelho de Lucas, que compreende a visitação de Maria à sua parenta Isabel, e o famoso cântico do Magnificat. Embora a assunção só tenha se tornado dogma em 1950, pelo papa Pio XII, as tradições relativas à festa em si são muito antigas. Inicialmente, celebrava-se essa festa com a denominação de “dormição de Nossa Senhora”, título que as igrejas do Oriente preservam até hoje. O sentido desta festa e do próprio dogma é fornecido pelo prefácio da missa: “Hoje, a virgem Maria, mãe de Deus, foi elevada à glória do céu. Aurora e esplendor da Igreja triunfante, ela é consolo e esperança para o povo ainda em caminho, pois preservastes da corrupção da morte aquela que gerou de modo inefável, vosso próprio Filho feito homem, autor da vida” (Prefácio da Assunção de Nossa Senhora). Trata-se, portanto, de uma festa que imprime muita esperança à Igreja e à humanidade inteira, pois expressa o cumprimento do amor de Deus pelo ser humano, levando-o ao seu verdadeiro destino, que é a participação na mesma glória de Jesus Cristo, seu Filho e nosso irmão. E Maria foi a primeira a gozar plenamente deste privilégio.

Como sempre, concentramos a nossa reflexão exclusivamente a partir do texto do evangelho proposto, o qual possui grande importância para o conjunto da obra de Lucas. E é importante começar considerando o contexto narrativo, que é o chamado “Evangelho da Infância”, formado pelos dois primeiros capítulos do Evangelho (Lc 1–2), que funcionam como introdução literária e síntese teológica de toda a obra. De fato, é praticamente unanimidade entre os estudiosos que, no “Evangelho da Infância”, Lucas antecipa as principais linhas teológicas da sua grande obra, composta também pelo livro de Atos dos Apóstolos, ao mesmo tempo em que sintetiza praticamente todo o Antigo Testamento e a história de Israel, construídos a partir do binômio “promessa-cumprimento”. E o trecho lido hoje é uma boa demonstração disso. De fato, os principais temas da obra lucana, como o protagonismo das mulheres, a opção pelos pobres, a força transformadora do Espírito Santo, a misericórdia de Deus e a natureza missionária da Igreja estão bem presentes no evangelho de hoje. Igualmente estão presentes as temáticas da fidelidade de Deus às suas promessas, ao longo da história, assim como o seu favorecimento aos pequenos e marginalizados, traços bem característicos do Antigo Testamento.

E o primeiro tema evidenciado no evangelho de hoje é exatamente o protagonismo feminino: a cena é dominada pelo encontro de duas mulheres que, em diálogo, expressam suas impressões sobre os últimos acontecimentos, reconhecendo neles o agir de Deus, e apontando um futuro novo. Ao longo de toda a Bíblia, são raras as cenas dessa natureza. Com isso, o evangelista preconiza o início de uma nova história para a humanidade, com novas perspectivas e esperanças; trata-se de uma história construída e escrita a partir dos pobres, desprezados e marginalizados da sociedade, como eram as mulheres na época em que Evangelho foi escrito. O que Deus sempre propôs à humanidade, começa a cumprir-se e a realizar-se definitivamente a partir do sim de Maria. Como pessoas simples e humildes, Maria e Isabel, protagonistas do episódio, são uma prova de que o Deus de Israel tem um lado na história: o lado dos pobres, humildes e marginalizados, a quem ele dirige o seu olhar misericordioso (v. 48). Na figura dessas duas mulheres, Lucas ilustra o encontro das duas alianças, dos dois testamentos, reforçando a presença de Deus como artífice e condutor da história.

Certamente admirada com tudo o que estava acontecendo consigo e com Isabel, pois o anjo lhe informara (Lc 1,36), Maria tomou a firme decisão de ir visitar sua parenta. Assim diz o texto: «Naqueles dias, Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se, apressadamente, a uma cidade da Judeia» (v. 39). Embora a maioria das interpretações apontem o desejo de servir a Isabel como o motivo da partida apressada de Maria, o texto não fornece nenhum indício a respeito disso. Sem dúvidas, o serviço ao próximo sempre fez parte do estilo de vida de Maria, sobretudo após o seu decisivo sim a Deus. Inclusive, ao dar o sim ao projeto de Deus, ela se apresentou como verdadeira servidora (Lc 1,38). Mas aqui se pode ver algo além disso. Ora, quando Maria questionou o anjo no momento do anúncio, sobre como poderia engravidar se não tinha relação com homem algum (Lc 1,34), o anjo disse que tudo seria obra do Espírito Santo, e ainda deu um exemplo concreto como sinal e prova de que nada é impossível para Deus: Isabel, uma anciã estéril, estava grávida (Lc 1,36). A gravidez de uma anciã estéril seria tão surpreendente quanto a de uma jovem virgem. É, portanto, normal e compreensível que Maria tenha procurado Isabel para confirmar se o que anjo lhe dissera era verdade, afinal, ela era muito jovem para compreender temas dessa natureza, ainda mais por integrar uma sociedade marcada por inúmeros tabus, sobretudo para as mulheres. Também é normal que tenha procurado sua parenta para partilhar a alegria do que estava acontecendo com ambas, como sinal da fidelidade de Deus ao seu povo, Israel, de quem as duas são imagens.

Ao conceder tanto espaço a Maria no início do seu Evangelho, Lucas está criando o modelo ideal de discípulo e discípula para Jesus. Por isso, é importante apresentá-la em movimento, disposta a proclamar, até nos lugares mais distantes, as maravilhas de Deus e a certeza de que ele está construindo uma nova história, a partir das pessoas humildes e marginalizadas. A partida de uma jovem grávida de Nazaré, na Galileia, para a Judeia antecipa os desafios da missão e a necessidade dos discípulos de todos os tempos estarem sempre em estado de saída. Mesmo que a distância não fosse tão grande, as circunstâncias eram muito adversas para uma jovem mulher. É típico da obra lucana o movimento, o sair de si. Essa partida imediata de Maria faz dela um modelo de discípula e, ao mesmo tempo, inaugura o primeiro movimento de Jesus: ainda no ventre, Ele já estava inquieto e pronto a romper qualquer situação de estabilidade e tranquilidade, mesmo enfrentando adversidades e perigos, como Maria teria enfrentado no caminho, indo sozinha para uma região montanhosa e de difícil acesso.

O evangelista diz que, chegando ao destino, Maria «Entrou na casa de Zacarias e cumprimentou Isabel» (v. 40). Muito mais do que cumprimentar, o verbo “saudar” seria mais apropriado na tradução do texto. A expressão hebraica para a saudação é o desejo de paz – o hebraico shalom. Mais tarde, ao enviar seus discípulos em missão, Jesus ordenou que eles desejassem a paz em cada casa que entrassem (Lc 10,5). Isso mostra que, aqui, mais uma vez, Maria antecipa a atitude de cada discípulo e discípula de Jesus: ser portador(a) da paz! Maria é mesmo a imagem ideal de todo discípulo e discípula de Jesus. E a paz que Jesus comunica é sempre inquieta; não é tranquilidade nem resignação; é o acesso aos bens messiânicos, como a libertação de todas as cadeias de morte impostas pelos sistemas dominantes, é a conquista de um mundo com igualdade e bem-estar para todos. E o evangelista sempre apresenta Maria quebrando paradigmas: como mulher inovadora e corajosa, ela ignora a tradição patriarcal e saúda a mulher ao invés do homem, ao entrar na casa (v. 40). Assim, ela provoca uma verdadeira revolução e inversão de valores nas relações sociais, como aprofundará mais adiante, no seu hino, o Magnificat. Na sociedade do seu tempo, quem deveria ser saudado era o dono da casa; saudando a mulher, ela afirma que um tempo novo está surgindo, com novas relações e uma nova ordem. Percebe-se que, apesar de poucos, cada gesto de Maria antecipa o futuro agir libertador Jesus. O mesmo pode ser constatado com suas palavras que, embora também sejam poucas, antecipam toda a mensagem de Jesus. Isso quer dizer que, ao mesmo tempo em que Lucas a apresenta como modelo de discípula, ele reconhece que, na condição de mãe, ela foi também mestra de Jesus.

A saudação de Maria irradia paz no ambiente, a ponto de fazer até mesmo a criança, ainda no ventre, agitar-se (v. 41a), o que confirma que a paz de Jesus, que ela antecipa, não combina com tranquilidade, mas provoca inquietude. Isso porque Isabel também ficou «cheia do Espírito Santo» (v. 41b), como Maria já estava. Trata-se do mesmo Espírito prometido pelo anjo a Maria no momento do anúncio: «O Espírito Santo descerá sobre ti» (Lc 1,35a). Como força vital, o Espírito Santo é luz irradiante e interpelante, que pode ser sentido quando transmitido por pessoas cheias dele, como Maria. Quem recebe o Espírito Santo, o irradia por onde passa e onde chega, como um contágio. A atitude de Isabel não poderia ser outra, senão exclamar, gritando: «Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!» (v. 42). É a palavra profética que nela se atualiza. Sabendo que Maria carregava dentro de si o Messias, isso fazia dela a mais “bendita” entre todas as mulheres. Assim, Isabel torna-se a primeira a proclamar as “bem-aventuranças” no Evangelho de Lucas. Ora, gerar filhos na mentalidade bíblica, era sinal de bem-aventurança e bênção; uma confirmação de que se tinha Deus a seu favor. Logo, gerar o Messias tão esperado seria prova de uma dignidade inigualável.

Tendo composto seu Evangelho com muita atenção para a Escritura hebraica, o Antigo Testamento, Lucas procura atualizá-la no “evento Cristo”. Assim, na continuação da exclamação de Isabel, o evangelista desenha Maria como a nova “Arca da Aliança”. Como sabemos, na arca da aliança eram guardadas as tábuas da lei, sinal máximo da presença de Deus no meio do seu povo, conforme a fé do povo de Israel. Com esta exclamação de Isabel: «Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar?» (v. 43), Lucas relembra e atualiza as palavras de Davi quando estava para receber a Arca em sua casa: «Como virá a Arca de Iahweh para minha casa?» (2 Sm 6,9). Portanto, Lucas percebe em Maria a arca da nova da aliança, não mais portadora da Lei escrita em tábuas de pedra, e sim portadora do amor e da misericórdia de Deus, conforme Jesus veio manifestar ao mundo. E a Lei que Maria carrega em si é o próprio Jesus, com seu Evangelho libertador e o Espírito Santo, do qual ela estava cheia e, por isso, o irradiava, sendo a primeira a viver a experiência de Pentecostes, enquanto envio do Espírito Santo ao mundo. Convém recordar que Lucas compara os eventos do Antigo Testamento com os do Novo para mostrar a superioridade do Novo. Assim, enquanto diante da arca, Davi exclamou com medo (2 Sm 6,10), diante de Maria, Isabel exclamou de alegria, o que mostra que a Lei escraviza, enquanto o Espírito, que é amor, liberta, transforma, humaniza.

E, mais uma vez, Lucas faz Maria ser reconhecida como bem-aventurada: «Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu» (v. 45). O motivo do reconhecimento, desta vez, é a fé: ela é bem-aventurada porque acreditou. Além de exaltar a fé de Maria, as palavras de Isabel funcionam também como uma repreensão ao seu esposo Zacarias, o qual, ao contrário de Maria, não acreditou no anúncio do anjo (Lc 1,20), por isso ficou mudo até que o menino nascesse. Assim, Isabel combate a incredulidade do marido e reforça a sua fé renovada pela presença de Maria, como ela confessou: «Será cumprido o que o Senhor lhe prometeu» (v. 45b). Ao repreender a incredulidade do esposo Zacarias, um sacerdote, Isabel proclama a decadência da antiga religião oficial do templo, demonstrando que somente os pobres, simples e humildes são capazes de acolher as intuições do Espírito Santo, como fez Maria. Assim, a religião do rigor e da Lei estava superada, pois não capacitava o ser humano para perceber o agir de Deus na vida e na história. Isso quer dizer que, para o evangelista, o exemplo de fé não está nas autoridades religiosas, mas nas pessoas simples e humildes.

Na sequência do texto, finalmente, Maria toma a palavra, pois somente Isabel tinha falado até aqui. As entrelinhas apontam para um provável constrangimento de Maria, diante de tantos elogios. Por isso, o evangelista mostra ela praticamente interrompendo Isabel, para expressar a sua alegria e o louvor a Deus, com o seu magnífico cântico (vv. 46-54). Isto reflete, certamente, a preocupação do evangelista com a construção futura da imagem de Maria na Igreja: não é ela que deve ser louvada, mas o Deus que agiu nela. O centro do culto e da vida cristã é sempre Deus, pois é ele o autor das maravilhas operadas e, portanto, é a ele que o reconhecimento e o louvor devem ser dirigidos. O Magnificat é o primeiro dos cânticos que Lucas apresenta em seu Evangelho. Trata-se de uma composição que sintetiza todo o Antigo Testamento e, ao mesmo tempo, antecipa a missão de Jesus. Lucas faz uma construção nova com pedras antigas, pois o texto é um verdadeiro mosaico de citações do Antigo Testamento. A estrutura básica é tomada do cântico de Ana (1Sm 2,1-10), o que se explica pela semelhança das duas situações, uma vez que, assim como Isabel, também Ana era considerada estéril e concebeu um profeta, Samuel, como Isabel concebeu João Batista. Se Isabel estava maravilhada por contemplar grandes coisas (vv. 42-45), Maria lhe ajuda a compreender melhor tal situação, convidando-a a olhar para a história e perceber que, na verdade, esse Deus de Israel nunca esqueceu o seu povo, sempre fez grandes coisas em seu favor e, portanto, é a Ele que o louvor deve ser dirigido. Tudo o que estava acontecendo era dom de Deus e prova da sua fidelidade.

Em seu cântico, Maria personifica Israel e resume os grandes feitos de Deus na história, destacando, sobretudo, a sua predileção pelos pobres, humildes e humilhados. Quando reconhece que «o Todo-Poderoso fez e faz grandes coisas» (v. 49), também se afirma que não há outros poderosos, exatamente porque devem ser derrubados de seus falsos tronos (v. 52). E essa é a primeira condição para o início da edificação do Reino de Deus: a queda dos poderosos, ou seja, de todos os detentores de poder que oprime e mata. Um só é o Poderoso, Deus, e este destina seu poder em favor da libertação dos pequenos. Temos, então, o início do cumprimento das antigas promessas, agora sob a responsabilidade de Jesus e da comunidade dos seus discípulos, da qual Maria é modelo. Aqui, mais uma vez, Lucas faz Maria antecipar o programa messiânico de Jesus, que será anunciado na sinagoga de Nazaré (Lc 4,16-18) e confirmado no sermão da planície. De fato, a expressão «Encheu de bens os famintos» (v. 53a), antecipa as bem-aventuranças dirigidas aos pobres (Lc 6,20-21); já a expressão «Despediu os ricos de mãos vazias» (v. 53b) antecipa as maldições lançadas contra os ricos – “ai de vós” (Lc 6,24-25). O Magnificat é, sem dúvidas, a síntese da oração de Israel que deverá ser continuada pela comunidade dos discípulos de Jesus, a comunidade cristã. É clara, portanto, a intenção de Lucas de antecipar a missão de Jesus. Isso mostra também que ele é o evangelista que mais retoma a mensagem profética de denúncia às injustiças sociais. A predileção de Deus pelos pequenos, tão clara no ministério de Jesus, é central na mensagem dos profetas do Antigo Testamento. E o Magnificat evidencia bem essa continuidade.

A conclusão do texto reafirma a imagem de Maria como nova arca da nova aliança, mas com uma dimensão completamente nova. Diz o evangelista que «Maria ficou três meses com Isabel; depois voltou para casa» (v. 56). No Antigo Testamento há uma expressão muito parecida com essa, em 2Sm 6,11, e certamente Lucas pensou nela, ao falar da permanência de Maria na casa de Isabel: «A Arca de Iahweh ficou três meses na casa de Obed-Edom de Gat, e Iahweh abençoou a Obed-Edom e a toda a sua família». A presença de Maria na casa de Isabel foi, com certeza, a confirmação da bênção de Deus sobre ela, seu esposo Zacarias e o filho esperado, João. Mas a bênção que a presença de Maria inaugura é infinitamente superior a tudo o que até então se tinha experimentado, pois é o início da plenitude da presença de Deus em meio ao seu povo. Na arca da nova aliança já não há tábuas de pedra com a Lei inscrita, não há mais norma nem preceito; há o Espírito Santo e Jesus, expressão máxima do amor e da misericórdia de Deus para com toda a humanidade. O tempo de permanência de quem irradia o Espírito Santo e a alegria do Evangelho, como fez Maria e assim devem fazer os discípulos de todas as épocas, é o suficiente para ressignificar a vida e ler os acontecimentos do presente à luz de tudo o que Deus tem realizado ao longo da história, como cantado no Magnificat.

Mais do que um reforço à devoção, o evangelho deste dia é um convite e advertência à comunidade cristã a reencontrar-se com suas origens, com sua identidade missionária e sinodal, assumindo seu compromisso de ser presença do Reino, promovendo igualdade e fraternidade. Para isso, é necessário renovar a confiança no Espírito Santo, que é aquele que dá impulso à força transformadora dos pequenos e humildes. Um trecho do evangelho tão significativo como este, no qual apenas duas mulheres falam, discutindo um novo rumo para a humanidade, não pode deixar de ser visto também como um sinal de que a voz feminina precisa ser mais ouvida e valorizada na Igreja.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

sábado, agosto 09, 2025

REFLEXÃO PARA O 19º DOMINGO DO TEMPO COMUM – LUCAS 12,32-48 (ANO C)

 


A liturgia deste décimo nono domingo do tempo comum continua a nos situar no caminho de Jesus para Jerusalém. Com isso, somos chamados a continuar refletindo sobre a condição de discípulos e discípulas, uma vez que esse caminho é a mais genuína e profunda catequese de Jesus para o seu discipulado de ontem e de hoje. Como tem sido afirmado nos últimos domingos, o caminho de Jesus no Evangelho de Lucas é um programa formativo, constituído de dez capítulos (Lc 9–19), nos quais são tratados diversos temas, e todos conexos entre si. O texto de hoje – Lc 12,32-48 – apresenta o tema da vigilância e da responsabilidade como exigências para a comunidade herdeira do Reino, a qual é chamada ao encorajamento diante das dificuldades enfrentadas ao longo do “caminho”. Pode-se dizer que esse caminho, aqui, é a própria história no seu desenrolar-se e, portanto, o que Jesus ensinou aos seus discípulos de primeira hora, continua válido para os cristãos e cristãs de todos os tempos e lugares. Para uma melhor compreensão do texto, que é bastante longo, podemos dividi-lo em duas partes: uma primeira, introdutiva (vv. 32-34), e uma segunda, composta de três pequenas parábolas (vv. 35-48) que visam ilustrar com imagens o tema apresentado na introdução. É um texto longo, mas bastante compreensível, desde que esteja claro o seu contexto, que é o caminho formativo da comunidade.

O primeiro versículo é a grande chave de leitura para todo o texto: «Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o reino» (v. 32). O pedido de encorajamento (v. 32a) é sinal de que a proposta de Jesus não é de fácil assimilação, sobretudo em seus desdobramentos práticos. Na verdade, era uma proposta arriscada e até perigosa, conforme a mentalidade vigente na época, e continua sendo também nos dias de hoje. As exigências e responsabilidades para segui-lo eram muitas, por isso havia tendência à desistência entre os discípulos. De fato, à medida em que avançava no caminho, Jesus sentia que as hostilidades e obstáculos ao seu revolucionário projeto só aumentavam, tanto por fatores externos quanto internos. Com o aumento das exigências, os discípulos começavam a perceber que Jesus não apresentava nenhum traço do messias ideal, esperado há séculos. Ao invés de messias triunfante, como esperavam os judeus, um restaurador do reino davídico-salomônico, Jesus parecia um fracassado, mostrando que suas pretensões não passavam da constituição de um «pequeno rebanho» (em grego: μικρὸν ποίμνιον – mícron poímnion). Ora, os discípulos esperavam um líder comandante de um exército, de repente Jesus se apresenta apenas como um simples pastor de um pequeno rebanho. Diante disso, ele insistia pedindo coragem e perseverança, ao ver que seus discípulos davam demonstração de desânimo e vontade de desistir.

Com efeito, os discípulos precisavam de muita coragem e perseverança, exatamente porque a comunidade de Jesus, núcleo embrionário do Reino de Deus, não passava de um «pequenino rebanho» (v. 32a), praticamente invisível e sem importância, diante das grandes estruturas religiosa e política da época: o judaísmo oficial e o império romano, respectivamente. Paradoxalmente, o pequeno rebanho tem um grande valor, pois «foi do agrado do Pai dar-lhes o Reino» (v. 32b). Realmente, trata-se de algo maravilhoso e até surpreendente, mas inconcebível para as pretensões triunfalistas vigentes naquele tempo, com as quais os discípulos de Jesus comungavam. O Reino proposto por Jesus, confiado pelo Pai à pequena comunidade, não contém os elementos esperados na época, tais como poder, riqueza, vaidade, concorrência e grandeza. A proposta de Jesus contempla uma verdadeira inversão de valores e, certamente, a comunidade dos discípulos não estava ainda pronta para absorver essa virada radical. Por isso, a insistência de Jesus ao pedir coragem e perseverança.

Na sequência do texto (v. 33), são apresentadas algumas das exigências para os discípulos decidirem continuar ou não como membros do pequeno rebanho: «vendei vossos bens e dai esmola» (v. 33a). Com certeza, no grupo dos discípulos ainda havia alguns fazendo média com Jesus, aderindo pela metade, ou seja, aparentemente despojados, mas com algumas reservas escondidas, como Ananias e Safira, em Atos dos Apóstolos (At 5,1-11). Por sinal, é importante recordar que o contexto do texto reflete mais a situação das comunidades na época da redação do Evangelho – anos 80 do primeiro século – do que mesmo o grupo dos primeiros discípulos diretamente chamados por Jesus. Ao narrar os eventos do caminho de Jesus, Lucas pensa nas comunidades do seu tempo, que se sentiam pressionadas pelo judaísmo oficial e perseguidas pelo império romano. Inclusive, tinham dificuldade em aceitar a pequenez que representavam diante de outras estruturas, como a da própria religião judaica, com uma grande rede de sinagogas espalhadas por todo o império romano, apesar de não contar mais com o magnífico templo de Jerusalém, destruído no início dos anos setenta. Diante disso, o evangelista recorda que foi o próprio Jesus quem admitiu a pequenez da comunidade que, paradoxalmente, é embrião do Reino de Deus.

E um dos entraves para o Reino tornar-se cada vez mais manifesto nas comunidades era o apego aos bens materiais por parte de seus membros, ou seja, pelos próprios discípulos. Percebendo isso, Jesus pede um desprendimento total. Parece que aquela parábola do rico insensato, refletida no domingo passado (Lc 12,13-21), ainda tinha suficiente para esclarecer aos discípulos sobre a incompatibilidade entre o apego aos bens materiais e os valores do Reino. De fato, a insistência de Jesus com um mesmo ensinamento reflete a dificuldade de assimilação pelos seus discípulos. Não à toa, o tema do desapego aos bens ocupa bastante espaço na seção do caminho. Além de várias parábolas que versam sobe este tema, há diversos ensinamentos diretos de Jesus a respeito disso, sempre com frases no imperativo. E não basta vender os bens, é necessário aplicar bem o valor destes para que, realmente, um tesouro no céu seja adquirido, isto é, partilhando com os pobres. «Dar esmola» na mentalidade semítica significa fazer justiça. Ora, as pessoas ficam empobrecidas à medida em que são injustiçadas, por isso, os pobres são, acima de tudo, necessitados de justiça. Logo, são, por excelência, os destinatários das esmolas, na Bíblia. Sempre que Jesus solicita que alguém se desfaça de bens materiais ele recomenda que dê aos pobres. Com efeito, na linguagem bíblica, a esmola é sempre expressão de justiça e compaixão. Inclusive, na língua original do evangelho, esmola (em grego: ἐλεημοσύνη – eleemossyne) possui a mesma raiz do verbo empregado na liturgia para invocar a misericórdia de Deus, adaptado ao português como “eleyson”.

A continuação do versículo mostra o que deve ser o verdadeiro objetivo dos discípulos de Jesus: possuir «um tesouro no céu» (v. 33b), ou seja, buscar coisas que não se acabam, mas que permanecem para toda a vida. Ora, os discípulos ainda não tinham assimilado o ensinamento da parábola do rico insensato (Lc 12,13-21), ou seja, não tinham compreendido a necessidade de que é necessário perder aos olhos do mundo, para ganhar aos olhos de Deus. Jesus pede para que eles busquem o que é eterno, o que realmente tem valor no Reino que o Pai lhes confiou. E esse é um tema muito caro para Lucas (Lc 11,41; 16,9; 19,8). Ao longo de toda a sua obra, ele aborda essa temática, e sempre de modo bastante interpelante, seja com parábolas, seja por meio de relatos do cotidiano da própria comunidade (At 2,41-47; 4,32-37). Os bens deste mundo são todos perecíveis, por isso, não se pode depositar segurança neles. Além disso, costumam ser motivo de discórdia, tanto entre países, entre regiões de um mesmo país quanto entre irmãos, membros da mesma família, como se via no evangelho do domingo passado, quando Jesus foi interpelado a intervir numa contenda familiar sobre herança. Por isso, a partilha, motivada pelo amor, é tão essencial para o seguimento de Jesus.

A conclusão da primeira parte do texto é feita com um provérbio: «Onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração» (v. 34). Vale a pena recordar a importância do uso da imagem do “tesouro” na Bíblia. O primeiro sentido é a reunião de coisas preciosas acumuladas para serem conservadas como sinal de segurança, por isso, deveria ficar escondido, pois, se revelado, logo seria alvo de cobiça e estaria sujeito a assaltos. Como significa algo muito precioso, o termo passou a ser usado como imagem de realidades espirituais, em contraposição a bens materiais, principalmente na literatura sapiencial (Pr 2,4; Sb 7,14; Eclo 1,25). Todo judeu possuía um tesouro, independentemente do valor, porque tinha algo central em sua vida. O que o ser humano considerava mais importante na sua vida era o seu tesouro. Jesus se apropria desse uso para ilustrar a sua descrição do Reino de Deus em diversas ocasiões, como no texto de hoje. Como o coração para a mentalidade hebraica significava a sede do pensamento e da consciência do ser humano, ou seja, o centro da vida, Jesus quer dizer que é para o tesouro que a vida do homem se volta. Por isso, é necessário escolher bem o tesouro no qual se vai depositar toda a segurança, o que corresponde ao sentido da vida.

Na continuidade da catequese, Jesus apresenta três pequenas parábolas com o intuito de reforçar o ensinamento proposto. Ora, se durante a sua presença física, Ele já via sinais de desânimo entre os discípulos, muito mais seria quando já não estivesse mais fisicamente entre eles. Por isso, as parábolas insistem no tema da vigilância e da responsabilidade, preparando a comunidade para a continuidade da missão após sua morte. Estas parábolas são, ao mesmo tempo uma chamada de atenção aos discípulos e uma crítica à hierarquia religiosa judaica. A localização destas parábolas ainda no início do caminho é sinal da importância que o tema da vigilância possui para Lucas, pois se trata de um tema escatológico, mais apropriado para a fase final do ministério de Jesus em Jerusalém, próximo à sua morte, como fazem Marcos e Mateus, inserindo parábolas semelhantes (Mc 13,32-37; Mt 24,42-51). Ao colocá-las logo na etapa do caminho, o evangelista Lucas indica a importância do tema e a necessidade de mantê-lo em evidência no dia-a-dia da comunidade, ensinando que a vigilância não é uma atitude a se tomar no final da vida, e sim durante toda a existência.

A primeira parábola apresenta a imagem de um senhor que viaja para uma festa e deixa tudo aos cuidados dos seus servos (vv. 35-38). É introduzida com um imperativo: «Que vossos rins estejam cingidos e as lâmpadas acesas» (v. 35). Parece uma imagem sem sentido para os dias atuais, mas muito significativa no seu contexto. É a imagem de quem está em atitude de serviço. A vestimenta básica da época era a túnica; essa não facilitava o serviço, pois atrapalhava o movimento. A expressão «os rins cingidos» quer dizer estar com a túnica levantada até a cintura, posição dos rins, presa ao cinto. Com isso, facilitava-se o movimento. Era assim que ficavam as pessoas enquanto trabalhavam ou viajavam. Significa estar pronto para caminhar e servir. Jesus pede uma postura vigilante, mas ao mesmo tempo serviçal. Seus discípulos devem vigiar sim, eis o sentido das «lâmpadas acesas»; mas, enquanto vigiam colocam-se em prontidão para o serviço. Foi “cingido” que Jesus lavou os pés dos discípulos na última ceia (Jo 13,4-5). Também os hebreus celebraram a primeira Páscoa assim: «E comereis assim: com a cintura cingida, as sandálias nos pés» (Ex 12,11a). Há uma clara intenção da parte de Lucas de incentivar a comunidade a manter-se constantemente em espiritualidade pascal. Isso se confirma pela continuação da parábola, na qual se diz que, quando o senhor voltar da festa, fará os servos sentarem-se à mesa, e os servirá (v. 37). Uma atitude surpreendente para quem é senhor. Essa é uma das mais belas imagens que Jesus aplica a Deus e a si mesmo: um senhor, grande proprietário que, ao invés de exigir serviço dos seus servos, abaixa-se para servi-los. Somente Jesus, sendo Senhor, fez-se servo (Lc 22,27).

A segunda parábola (vv. 39-40) apenas reforça a necessidade da vigilância, através da imagem do ladrão que não avisa a hora do assalto, mas procura exatamente surpreender o dono da casa. É necessário que a comunidade não seja surpreendida. Essa é a única vez, em toda a Bíblia, que Deus é apresentado como um ladrão, embora o “Dia do Senhor” seja apresentado com essa mesma imagem (1Ts 5,2; 1Pd 3,10; Ap 3,3). A falta de conhecimento do dia e da hora da vinda do Senhor deve ser motivo para a comunidade não desviar o foco por um único instante; isso quer dizer que os discípulos não podem, em momento algum, deixar de viver o programa de Jesus, ou seja, o Evangelho do Reino.

A terceira parábola (vv. 42-48) é uma resposta direta à pergunta de Pedro: «Senhor, tu contas essa parábola para nós ou para todos?» (v. 41). Está claro que os discípulos não eram os únicos ouvintes de Jesus quando ele profere estes ensinamentos. Essa pergunta de Pedro reflete o medo da responsabilidade que afligia os discípulos. De fato, para um rebanho tão pequeno, era muita responsabilidade herdar o Reino e assumir as suas consequências. Jesus não responde diretamente a Pedro, mas com a parábola (vv. 42-48), como faz com outros interlocutores. Dessa vez, ele faz uma crítica explícita à hierarquia religiosa judaica, acusada de relaxamento e mau exemplo desde os tempos do profeta Ezequiel, através da imagem dos «maus pastores» (Ez 34,1-10), e ao mesmo tempo alerta a comunidade dos discípulos a perseverar como guardiã do Reino, consciente da responsabilidade. Provocado pela pergunta de Pedro, e percebendo a sua insegurança, Jesus direciona o ensinamento a todos os discípulos. É deles que serão feitas exigências maiores, exatamente porque a eles foi confiado o Reino. E essas exigências se estendem aos discípulos e discípulas de todos os tempos. Por isso, ele ilustra com a contraposição de comportamentos de dois servos. O primeiro age com prudência, fidelidade e comportamento exemplar, e tem como recompensa um crescimento na confiança do seu senhor (vv. 42-44). O segundo, pelo contrário, relaxa nas comodidades da vida e no abuso do poder (vv. 45-46).

Comer e beber em demasia, até embriagar-se, era sinal de felicidade, numa sociedade e religião que pregavam a prosperidade como bênção de Deus, assim como maltratar os criados e criadas não passava de uma demonstração de autoridade. Jesus reprova tais atitudes, pois ferem a dignidade humana e distraem o ser humano do essencial, que é cultivar tesouros no céu e não se deixar dominar pelas coisas passageiras como comida e bebida. A punição anunciada – “partir ao meio” (em grego: διχοτομήσει – dikotomêssei) – era a máxima execução aplicada na Pérsia, mais cruel até que a crucifixão no império romano. No mundo judaico, expressava a pena destinada a quem transgredia a aliança com Deus, embora não se tenha notícia de ter sido realmente aplicada. Não se trata propriamente de um anúncio de castigo, mas de um alerta à perda de sentido da vida. Partido ao meio, o ser humano estava impedido de participar da ressurreição no último dia, como acreditavam os judeus. Portanto, estavam destinados ao sofrimento eterno. Essa é a imagem de uma vida sem sentido. Os versículos conclusivos (vv. 47-48) refletem uma particularidade do direito judaico: a responsabilidade e a culpa têm uma proporção gradual segundo o nível do conhecimento. As penas eram aplicadas de acordo com o nível de conhecimento da lei. Quem conhece a vontade de Deus, expressa sobretudo nas Sagradas Escrituras, tem o dever de pô-la em prática primeiro, bem como quem detém dons e carismas na comunidade. E é esse o objetivo do evangelista: chamar a atenção das lideranças da comunidade que, além dos processos de institucionalização e hierarquização, davam sinais de comodismo e relaxamento em relação às exigências do Evangelho.

Percebemos, então, com evangelho de hoje, o convite de Jesus à comunidade-Igreja para abraçar com humildade a responsabilidade de herdeira do Reino, tendo a missão de fazer esse Reino crescer. É preciso conscientizar-se da condição de pequeno rebanho, renunciando a qualquer mentalidade triunfalista e pretensões de poder. Toda a comunidade é convidada a empenhar-se nesse projeto, pois ela toda é herdeira. Porém, há uma exigência maior para aqueles que assumem responsabilidades maiores. Para isso, é necessária a vigilância constante. E o sentido da vigilância não é provocar medo, mas tornar as pessoas atentas, sensíveis e disponíveis à vontade de Deus e às necessidades do próximo.

Pe. Francisco Cornelio Freire Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

sábado, agosto 02, 2025

REFLEXÃO PARA O 18º DOMINGO DO TEMPO COMUM – LUCAS 12,13-21 (ANO C)



O evangelho deste décimo oitavo domingo do tempo comum – Lc 12,13-21 – continua ambientado no contexto do longo caminho de Jesus com seus discípulos para Jerusalém, onde viverá a consumação da sua missão, com os eventos da paixão, morte e ressurreição. Como tem sido enfatizado há alguns domingos, esse caminho constitui a seção narrativa mais longa e mais original de todo o Evangelho segundo Lucas, totalizando dez capítulos (Lc 9 –19). Por consequência, é também a seção que fornece mais textos para a liturgia dominical do ano C. De fato, do décimo terceiro ao trigésimo primeiro domingo do tempo comum, no respectivo ano litúrgico, o evangelho compreende uma passagem do caminho, embora nem todos sejam vivenciados, devido a algumas solenidades celebradas nesse intervalo. Como sempre, é importante recordar que, mais do que um percurso físico/geográfico, esse caminho é, acima de tudo, um itinerário formativo, teológico e catequético, no qual Jesus apresenta os principais elementos do seu ensinamento aos discípulos e Lucas os transmite com tanta habilidade aos leitores da sua obra em todos os tempos.

Podemos dizer que Lucas juntou os principais ensinamentos de toda a vida de Jesus e distribui-os na seção do caminho, mesclando textos exclusivos seus com outros comuns aos demais evangelhos sinóticos (Mateus e Marcos). Enquanto caminha, Jesus entra em contato com as pessoas, deixando-se interpelar, interagindo. Enquanto faz isso, ele promove seu programa, que comporta uma verdadeira proposta de humanização para o mundo. Vale salientar que, mesmo quando interage com outros personagens durante o caminho, como acontece no evangelho de hoje, os destinatários principais da mensagem são sempre os discípulos. Assim, neste itinerário são abordados os temas fundamentais para a formação do discipulado de todos os tempos: a partilha, a importância da oração, o universalismo da salvação e da missão, a misericórdia, a necessidade de fazer renúncias e o perigo do apego aos bens materiais, tema do evangelho de hoje. Uma vez contextualizados, olhemos para o evangelho de hoje. Esse texto, que é exclusivo de Lucas, compreende um pedido de intervenção de Jesus por um homem desconhecido (v. 13), cuja resposta (vv. 14-15) é seguida de uma parábola que denuncia o perigo do apego aos bens e a confiança nas riquezas (vv. 16-21). Essa parábola ficou conhecida como a parábola do rico insensato.

Eis o texto: «Alguém, do meio da multidão, disse a Jesus: “Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo”» (v. 13). Esse pedido reflete uma situação bem frequente. Provavelmente, Jesus estava passando por um povoado, onde as opiniões dos rabinos – como Jesus era considerado – eram bastante requisitadas, sobretudo para ajudar a resolver questões que envolvessem a interpretação da Lei, como casos de herança, por exemplo. Inclusive, os rabinos eram muito interessados por questões desse tipo e se sentiam honrados quando solicitados, pois, além de ser uma oportunidade para exibir conhecimento, ainda recebiam uma recompensa financeira quando conseguiam promover o acordo. A questão das heranças era bem problemática em Israel, causando muitos conflitos familiares. Provavelmente, o homem que pede a intervenção de Jesus era um filho mais novo, já que era o filho mais velho quem tinha controle sobre toda a herança da família, de acordo com a Lei. Ora, enquanto o primogênito tinha direito a dois terços da herança, o outro terço era distribuído com os demais filhos (Dt 21,16-17). Em compensação, o primogênito tinha também o dever de cuidar da mãe viúva e das irmãs solteiras. De todo modo, a Lei permanecia ambígua e até injusta, em termos de equidade. Com efeito, era muito comum o filho primogênito manter o controle de toda a herança, negando-se a repartir com os outros a parte devida a cada um.

Geralmente, quando um filho mais novo pedia a divisão dos bens havia conflitos. Com frequência, levava-se a questão para ser resolvida nos tribunais, o que tornava a situação constrangedora para todos os envolvidos, devido à exposição pública. Nas famílias mais religiosas, a fim de evitar exposições, quando não se conseguia resolver internamente, buscava-se a intervenção de um rabino ou um mestre da Lei, os quais exerciam papel de advogado e juiz, sobretudo, nos pequenos povoados, onde quase ninguém conhecia a Lei em profundidade e nem havia um órgão jurídico funcionando permanentemente. Por isso, na passagem de um rabino por um povoado, era comum aparecer questões desse tipo. Ao pedido de intervenção, «Jesus respondeu: “Homem, quem me encarregou de julgar ou de dividir vossos bens?”» (v. 14). Antes de tudo, Jesus se nega a agir como os rabinos do seu tempo, e se recusa a arbitrar em questões desse tipo. A princípio, parece estranha a recusa, uma vez que, ao que tudo indica, alguém estava sendo injustiçado naquele caso, pois um irmão estava se negando a repartir a herança com o outro, ou seja, estava usurpando um direito. E, como promotor da fraternidade e da justiça, é claro que Jesus tinha interesse na resolução de conflitos entre irmãos. Mas, ao recusar a julgar a questão, Jesus não estava lavando as mãos, como aparenta. É claro que o mais lógico seria que ele interviesse e ajudasse na resolução do problema, chamando o outro irmão para conversar até convencê-lo a repartir a herança como determinava a Lei.

A primeira novidade deste episódio é a recusa de Jesus em atender o pedido de ajuda de uma pessoa aparentemente injustiçada. Na verdade, essa é única vez que ele se nega a ajudar alguém que lhe pede. Ora, com sua aparente omissão, Jesus ajudava a prolongar a discórdia entre os irmãos e, de certo modo, corroborando uma situação de injustiça. Mas Jesus conhecia as intenções daquele homem e a mentalidade vigente; sabia que sua reclamação não era motivada apenas por sentir-se injustiçado, mas pela ganância, ou seja, por ter depositado toda a confiança naquela herança. Se ajudasse a resolver aquele problema, conforme solicitado, Jesus estaria alimentando a ganância e o desejo de acúmulo, enquanto o problema era muito mais profundo. Resolvendo um caso a mais, não mudaria uma mentalidade tão impregnada naquela cultura. Por isso, ele prefere ir à raiz do problema. Ora, aquela herança um dia passaria por nova divisão, quando aquele homem morresse e a deixasse para seus filhos. Poderia ser causa de discórdia novamente. Jesus quer mostrar que no seu Reino as heranças não devem ser divididas, pois não devem existir, uma vez que tudo deve ser partilhado. Isso ele deixará claro com a parábola que segue. Ao invés de legalmente divididos, os bens devem ser partilhados conforme a necessidade de cada pessoa, e não de acordo com tradições e normas legais.

A parábola vai sendo preparada aos poucos. Do caso específico do homem que lhe pede intervenção, Jesus aproveita para chamar a atenção dos discípulos: «E disse-lhes: “Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida do homem não consiste na abundância de bens”» (v. 15). A expressão “disse-lhes” sinaliza que não é mais a um indivíduo, mas aos discípulos e a todos os ouvintes e leitores do Evangelho que ele está direcionando o ensinamento. A palavra grega traduzida por ganância (πλεονεξίας – pleonexías) significa o desejo de ter sempre mais, o não contentamento com o necessário. Logo, aqui ele faz uma advertência muito séria. Certamente, ele sentia muita resistência nos seus seguidores no processo de assimilação de seus ensinamentos. Assim, ele vai de encontro a toda uma mentalidade hebraica que via no acúmulo de bens, ou seja, na riqueza, um sinal da bênção de Deus. Jesus contraria esse princípio e rompe definitivamente com a teologia da prosperidade. O acúmulo de bens é, na verdade, a prova maior da falta de sentido para a vida e, inclusive, causa de discórdias. Portanto, é urgente para seus seguidores e seguidoras libertarem-se dos bens que aprisionam e escravizam, colocando-os à disposição de todos, mediante a partilha. Provavelmente, seus discípulos ainda não tinham aprendido a rezar como ele e continuavam pedindo mais do que o pão necessário para cada dia, contrariando a oração que ele tinha ensinado há pouco tempo (Lc 11,2-4), como vimos no domingo passado.

Finalmente, chegamos na parábola. Recordamos que, em Lucas, especialmente, as parábolas não surgem do nada, são sempre contextualizadas, surgem como aprofundamento ou ilustração de um ensinamento já começado e visam responder a questões concretas da existência, como acontece neste episódio: «E contou-lhes uma parábola: “A terra de um homem rico deu uma grande colheita”» (v. 16). A expressão “contou-lhes” evidencia, mais uma vez, que o destinatário não é somente o homem anônimo que lhe pediu ajuda, mas todos os ouvintes, especialmente os discípulos. A parábola apresenta a figura de um homem rico, grande latifundiário, o qual fora surpreendido com uma grande colheita. A atitude e o pensamento do personagem da parábola com a colheita abundante são descritos a partir de um monólogo interior, no qual é revelado, sobretudo, o seu caráter: «Ele pensava consigo mesmo: “O que vou fazer? Não tenho onde guardar minha colheita”. Então resolveu: “Já sei o que fazer! Vou derrubar meus celeiros e construir maiores; neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: Meu caro, tu tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, come, bebe, aproveita!» (vv. 17-19). Convém mencionar que, como escritor refinado que é, Lucas é o único autor do Novo Testamento a empregar o recurso literário do monólogo interior. Por meio deste recurso, o autor revela o pensamento do personagem.

Como se vê, o personagem da parábola é um homem voltado somente para si. Na sua vida não havia espaço para o outro. Praticamente todas as suas falas são em primeira pessoa singular – vou fazer; vou derrubar; vou guardar; poderei –, além de um uso excessivo de pronomes possessivos – minha, meus –, o que revela um egoísmo profundo. Toda a sua confiança é depositada na abundância dos bens. Em seu pensamento não há espaço para Deus e nem para o próximo; ele pensa somente em si e nos bens que possui, e esse é o seu grande pecado. Esse homem representa o “anti-discípulo”: apegado aos bens, ganancioso, egocêntrico, autossuficiente e insensato. Quem apresenta tais características não tem condições de seguir o caminho de Jesus. Tudo o que os discípulos e discípulas de Jesus não podem ser, esse homem era. E, ao apresentar esse homem como contraexemplo, Jesus contesta a teologia tradicional, alimentada sobretudo pelos escritos sapienciais, que via o acúmulo de bens, ou seja, a prosperidade como sinal das bênçãos de Deus e sinônimo de vida exitosa. Inclusive, a última frase atribuída ao personagem da parábola sintetiza tal mentalidade: «descansa, come, bebe, aproveita!» (v. 19). Em certos círculos sapienciais comer e beber em abundância era visto como o objetivo principal do ser humano e, consequentemente, símbolos do sentido da vida (Ecl 8,15).

Para Jesus, a vida de uma pessoa perde o sentido quando não contempla Deus e o próximo. Por isso, na parábola ele mostra a intervenção divina, em forma de advertência e de protesto à mentalidade mesquinha e egoísta daquele homem: «Mas Deus lhe disse: “Louco! Ainda nesta noite, pedirão de volta a tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?”» (v. 20). Aqui, não se trata de um ato vingativo de Deus, mas de um alerta, um convite à reflexão que é feito a cada pessoa, independentemente da quantidade dos bens acumulados. Quer dizer que é Deus a fonte da vida. É o sinal de contraposição à falsa segurança depositada, na riqueza, pelo homem da parábola (v. 19). Enquanto ele julgava ter vida longa pelo que havia acumulado, Deus entra na história para mostrar o que, de fato, tem valor. A pergunta final: “E para quem ficará o que tu acumulaste?” (v. 20b) é apenas uma ponte com o que gerou toda a discussão e a parábola: o pedido de intervenção daquele homem anônimo na divisão da herança. Ora, além de não garantir vida verdadeira, os bens acumulados ainda podem se tornar causa de discórdia, tirando a harmonia e a paz das pessoas. Por isso, a mentalidade egoísta e a ganância são tratados como loucura, insensatez. E o personagem da parábola é chamado de louco (em grego: ἄφρων – afron), de insensato, pois, ao pensar somente nos bens, tinha perdido a razão.

Com a frase final, Jesus completa o sentido da parábola e reforça a chamada de atenção aos discípulos: «Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não é rico diante de Deus» (v. 21). O acúmulo para si, como do personagem da parábola, torna o ser humano insensato, o leva a deixar de refletir sobre a vida e o seu sentido, tirando Deus e o próximo do seu horizonte. Isso é, consequentemente, empobrecer-se diante de Deus, pois priva a vida de sentido. Ser rico diante de Deus é, por outro lado, estar à disposição do seu projeto, cuja manifestação mais clara é a partilha e o serviço ao próximo. É isso que dá sentido à vida e torna a pessoa rica diante de Deus. Sendo a vida dom de Deus, essa só tem sentido quando o ser humano também se faz dom para o próximo. 

Jesus ensina, assim, a partir do pedido que o homem desconhecido lhe fez, aos seus discípulos a conscientizarem-se da incompatibilidade entre o seu seguimento e as riquezas deste mundo. Para isso, rompe, inclusive, com um princípio sagrado para o povo judeu, a herança. Se alguém deixou herança, foi porque acumulou. Se acumulou, foi porque não partilhou e, quem não partilha não está apto a fazer parte do Reino de Deus.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

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