sábado, dezembro 24, 2011

NATAL NA PERIFERIA: o verdadeiro natal!!!

Mais uma vez celebrando o natal, observo como o povo em geral se prepara para esse momento. O que mais me chama a atenção são as luzes que brilham intensamente nas casas, nos comércios, nas ruas, avenidas e praças das cidades grandes e pequenas.

Que bom que o uso de luzes é constante na preparação da chegada da LUZ MAIOR, a LUZ DA VIDA, Jesus Cristo! Ao mesmo tempo me questiono se tantas luzes com tantas cores não confundiriam até mesmo os magos que foram de todas as partes do mundo para render homenagem ao REI DOS REIS, guiados por uma única luz, a estrela guia!

Não os uso, mas também não condeno os tantos adornos que são usados como natalinos, mas confesso que me preocupo com o sentido que se dá a tantos enfeites. Tenho medo que estes ofusquem o sentido verdadeiro do natal e impeçam que brilhe no coração de todos, a LUZ VERDADEIRA: JESUS CRISTO!

Tenho medo que políticos e empresários oportunistas tornem seus palanques, lojas, shoppings e praças mais atraentes que a humilde mangedoura da periferia de Belém; até porque os adornos estão sempre nas regiões centrais das cidades, distantes das periferias... e foi na periferia onde aconteceu de fato o NATAL!!!

Para continuar e concluir minha reflexão, tomo emprestada a sabedoria de Pe. Zezinho com a música “NATAL NA PERIFERIA”:


 Por: Francisco C. F. Rodrigues, Apodi-RN, 24/12/2011.

domingo, dezembro 04, 2011

DOUTOR, ETERNAMENTE DENTRO DE NOSSOS CORAÇÕES

Uma das piores notícias que um corinthiano poderia receber às vésperas da possível conquista de mais um campeonato brasileiro: o falecimento do maior ídolo de todos os tempos da segunda maior torcida do Brasil, SÓCRATES, o doutor da bola.

Sendo o futebol o esporte predileto dos brasileiros, sendo inclusive um dos principais elementos da identidade nacional, é normal que os cidadãos brasileiros tenham jogadores como ídolos, como referências para suas vidas, embora nem todos os jogadores conseguem traduzir a habilidade em campo na seriedade do caráter fora das quatro linhas.

Sem dúvidas um dos que conseguiu ser craque no campo e fora foi o DOUTOR DA BOLA, SÓCRATES! Um homem, um cidadão, um exemplo de seriedade e de caráter. Não o vi jogar, mas mesmo assim o tenho como ídolo maior no mundo do futebol. Filho de uma geração inesquecível de jogadores, também lutou pela redemocratização do país, conseguindo levar o sonho da democracia para o âmbito do futebol, sendo assim uma referência em questões políticas. Penso que a palavra que melhor o define é simplesmente GÊNIO!!!

Adeus Doutor, o Brasil perde um de seus grandes cidadãos! O exemplo fica!

Francisco C. F. Rodrigues, Roma, 04/12/2011.

domingo, novembro 27, 2011

Ó VEM SENHOR, NÃO TARDES MAIS...


O bonito refrão de Zé Vicente é suficiente para introduzir-nos na espiritualidade ou tema do tempo que a Igreja inaugura hoje, o advento! Sem nenhum aprofundamento etimológico, está claro que a palavra advento tem a ver com vinda, chegada... algo ou alguém VEM ou ESTÁ CHEGANDO!

E, quem vem é o Cristo, o Messias, o Salvador, o Libertador, o Rei dos reis... por mais que usemos inúmeros adjetivos ainda não conseguimos descrever claramente AQUELE QUE VEM, o Senhor! Somente Ele é capaz de preencher os vácuos da nossa existência e saciar nossa sede de paz, justiça, esperança, amor! Daí a necessidade de nos prepararmos bem para tão magnífica chegada, aproveitando bem o que a Igreja proporciona em sua liturgia, através dos textos da Sagrada Escritura propostos para as celebrações deste tempo. No entanto, devemos estar atentos à linguagem dos textos selecionados e considerar o contexto geral da história da salvação.
Devemos nos preparar para a chegada do Senhor sem o medo de um acerto de contas, mas com a alegria de um encontro especial marcado pela ternura e o amor de um DEUS APAIXONADO, que sem deixar de ser Deus, faz-se carne, torna-se humano e vem ao mundo mostrar que apesar das fraquezas da carne, apesar das mazelas da vida em geral, é possível viver melhor. Com a encarnação do Verbo a nossa pertença a Deus se torna mais clara e mais real, podemos dizer que a vinda do Filho ao mundo faz a gente compreender melhor a existência de um Pai eterno; assim, podemos nos sentir mais filhos.

Nessa perspectiva do amor e ternura de Deus, vemos que a linguagem dura dos profetas e dos evangelhos é mais um elemento didático de uma pedagogia terna e misericordiosa de um Deus indescritível que faz até coisas impossíveis para que nenhum dos seus filhos se perca. Esse Deus que já tinha feito de tudo pelo seu povo: libertou da escravidão, deu uma lei, deu uma terra, formou comunidades, formou um reino, mandou profetas, protegeu o povo em perigosas batalhas... fez tudo que possamos imaginar! Mesmo assim, ainda não foi suficiente.

Por ser amor e misericórdia, Deus não permitiria que a obra-prima da criação se perdesse, e por isso fez mais uma aliança: escolhe uma mulher simples, mas cheia de graça para ser a mãe de seu Filho! Deus veio pessoalmente nos ensinar a viver melhor. Com isso reconhecemos também a importância de Maria na história da salvação, aceitando que nela acontecesse o impossível! Fato mais que extraordinário! Quantos homens e mulheres já haviam cooperado com Deus... muitos e muitas! Mas em nenhum caso a cooperação foi tão forte como a de Maria! Por isso a veneramos, a amamos e acreditamos que ainda hoje ela coopera intercedendo pelos filhos necessitados que a ela recorrem.

Vamos então nos preparar, ouvindo a Palavra, participando da Eucaristia e alimentando nossa fé a cada dia, na certeza que nosso Deus faz coisas impossíveis e vem ao nosso encontro para nos abraçar e dizer que nos ama incondicionalmente. Vem saciar nossa sede de paz!

Francisco C. F. Rodrigues, Roma, 27 de novembro de 2011.

sexta-feira, setembro 23, 2011

Precisamos de muita e muita coragem

Em 14 de setembro último, celebrou 90 anos de idade uma das figuras religiosas brasileiras mais importantes do século XX: o Cardeal Paulo Evaristo Arns. Voltando da Sorbonne, foi meu professor quando ainda andava de calça curta em Agudos-SP e depois, em Petrópolis-RJ, já frade, como professor de Liturgia e da teologia dos Padres da Igreja antiga. Obrigava-nos a lê-los nas linguas originais em grego e latim, o que me infundiu um amor entranhado pelos clássicos do pensamento cristão. Depois foi eleito bispo auxiliar de São Paulo. Para protegê-lo porque defendia os direitos humanos e denunciava, sob risco de vida, as torturas a prisioneiros políticos nas masmorras dos órgãos de repressão, o Papa Paulo VI o fez Cardeal.
Embora profético mas manso como um São Francisco, sempre manteve a dimensão de esperança mesmo no meio da noite de chumbo da ditadura militar. Todos os que o encontravam podiam, infalivelmente, ouvir como eu ouvi, esta palavra forte e firme: “coragem, em frente, de esperança em esperança”.
Coragem, eis uma virtude urgente para os dias de hoje. Gosto de buscar na sabedoria dos povos originários o sentido mais profundo dos valores humanos. Assim que na reunião da Carta da Terra em Haia em 29 de junho de 2010, onde atuava ativamente sempre junto com Mercedes Sosa enquanto esta ainda vivia, perguntei à Pauline Tangiora, anciã da tribo Maori da Nova Zelândia qual era para ela a virtude mais importante. Para minha surpresa ela disse:”é a coragem”. Eu lhe perguntei: “por que, exatamente, a coragem?” Respondeu:
”Nós precisamos de coragem para nos levantar em favor do direito, onde reina a injustiça. Sem a coragem você não pode galgar nenhuma montanha; sem coragem nunca poderá chegar ao fundo de sua alma. Para enfrentar o sofrimento você precisa de coragem; só com coragem você pode estender a mão ao caído e levantá-lo. Precisamos de coragem para gerar filhos e filhas para este mundo. Para encontrar a coragem necessária precisamos nos ligar ao Criador. É Ele que suscita em nós coragem em favor da justiça”.
Pois é essa coragem que o Cardeal Arns sempre infundiu em todos os que, bravamente, se opunham aos que nos seqüestraram a democracia, prendiam, torturavam e assassinavam em nome do Estado de Segurança Nacional (na verdade, da segurança do Capital).
Eu acrescentaria: hoje precisamos de coragem para denunciar as ilusões do sistema neoliberal, cujas teses foram rigorosamente refutadas pelos fatos; coragem para reconhecer que não vamos ao encontro do aquecimento global mas que já estamos dentro dele; coragem para mostrar os nexos causais entre os inegáveis eventos extremos, conseqüências deste aquecimento; coragem para revelar que Gaia está buscando o equilíbrio perdido que pode implicar a eliminação de milhares de espécies e, se não cuidarmos, de nossa própria; coragem para acusar a irresponsabilidade dos tomadores de decisões que continuam ainda com o sonho vão e perigoso de continuar a crescer e a crescer, extraindo da Terra, bens e serviços que ela já não pode mais repor e por isso se debilita dia a dia; coragem para reconhecer que a recusa de mudar de paradigma de relação para com a Terra e de modo de produção pode nos levar, irrefreavelmente, a um caminho sem retorno e destarte comprometer perigosamente nossa civilização; coragem para fazer a opção pelos pobres contra sua pobreza e em favor da vida e da justiça, como o fazem a Igreja da libertação e Dom Paulo Evaristo Arns.
Precisamos de coragem para sustentar que a civilização ocidental está em declínio fatal, sem capacidade de oferecer uma alternativa para o processo de mundialização; coragem para reconhecer a ilusão das estratégias do Vaticano para resgatar a visibilidade perdida da Igreja e as falácias das igrejas mediáticas que rebaixam a mensagem de Jesus a um sedativo barato para alienar as consciências da realidade dos pobres, num processo vergonhoso de infantilização dos fiéis; coragem para sentar na cadeira de Galeleo Galilei para defender a libertação e a dignidade dos pobres; coragem para anunciar que uma humanidade que chegou a perceber Deus no universo, portadora de consciência e de responsabilidade, pode ainda resgatar a vitalidade da Mãe Terra e salvar o nosso ensaio civilizatório; coragem para afirmar que, tirando e somando tudo, a vida tem mais futuro que a morte e que um pequeno raio de luz é mais potente que todos as trevas de uma noite escura.
Para anunciar e denunciar tudo isso, como fazia o Cardeal Arns e a indígena maori Pauline Tangiori, precisamos de coragem e de muita coragem.

Leonardo Boff, teólogo, filósofo, professor e escritor. 

sexta-feira, setembro 09, 2011

A Cruz: equívocos de interpretação


No dia 14 de setembro a Igreja celebra a "exaltação da Santa Cruz”. A festa recorda a época em que a fé cristã, tornada religião livre, e aos poucos hegemônica na Europa, propiciou aos cristãos cunharem símbolos de sua identidade, que favorecessem sua afirmação social e cultural.
O contexto histórico da fragmentação do império romano, favoreceu a constituição de uma nova entidade, com as suas diversas dimensões de ordem religiosa, cultural, social e econômica.
No âmbito do antigo império, foi emergindo a Igreja. Ela expressava o grande número de pessoas que passaram a fazer da nova fé religiosa, um elo de vinculação social, com suas práticas e seus símbolos.
Entre estes símbolos, sobressaiu a cruz. Pela maneira como ela evocava acontecimentos fundantes da nova fé, a cruz se tornou o símbolo mais eloqüente, com a vantagem de ser ao mesmo tempo simples na sua configuração, e profundo na evocação dos fatos centrais relativos a Cristo.
Foi então que cresceu a curiosidade por encontrar a cruz autêntica usada na execução de Cristo no calvário. Assim, o interesse pelo símbolo, despertou o interesse pelo objeto.
Nos inícios da Igreja primitiva não se encontra nenhum rastro deste interesse pelo objeto concreto da cruz de Cristo. Ao contrário, os fatos testemunham o grande impacto causado pela presença viva do Ressuscitado. Se ele estava vivo, pouco interessavam os instrumentos de sua morte. Não se comprova nenhum interesse em identificar ou guardar objetos que tinham estado em relação pessoal com Cristo. Ninguém se preocupava em saber onde teria ido parar o manto de Cristo, onde estaria o cálice usado por ele na última ceia, e assim por diante.
Só depois de estruturada como entidade, a Igreja passou a cultivar os símbolos de sua identidade. Foi então que emergiu a importância da cruz, como portadora de uma simbologia muito profunda, e bem caracterizada.
Todo símbolo recebe o seu significado do relacionamento concreto com os fatos que o constituíram como sinal. Cultivando esta vinculação, se aprofunda o significado do símbolo. Quanto mais, por exemplo, se relaciona a cruz com o testemunho de amor que Cristo expressou por ela, mais a cruz se torna símbolo de sua mensagem.
Mas, por contraste, quanto mais se vincula um sinal que já tinha o seu significado próprio, com contextos contrários a este significado, o símbolo inverte sua mensagem no novo contexto associado a ele.
Foi o que aconteceu com a cruz. Usada na morte de Cristo, passou por sua primeira grande metamorfose simbólica, deixando de ser sinal de condenação, para se tornar, para os cristãos, sinal de salvação.
Mas infelizmente, os cristãos usaram a cruz como símbolo das "cruzadas” contra os povos que habitavam a antiga "terra santa”. De tal modo que, para esses povos, até hoje a cruz é maldita, pois evoca os equívocos cometidos nestes episódios históricos.
Tanto que os cristãos precisam agora relativizar o uso da cruz no seu relacionamento com os muçulmanos.
Até entre os próprios cristãos, o uso da cruz não é unânime. Viajando pelo interior dos Estados Unidos, dá para distinguir claramente a diferença de cemitérios. Onde os túmulos são encimados pela cruz, o cemitério é católico. Onde os túmulos são desprovidos de cruz, o cemitério é protestante.
Parece que os cemitérios acabaram entrando na conversa de hoje, para dizer que os desentendimentos humanos são quase fatais. Até nossas bandeiras podem se tornar símbolos equivocados, se não soubermos distinguir, afinal de contas, entre o significante e o significado.
A propósito, o sábio provérbio latino nos adverte: "Cave a signatis!”. Isto é, cuidado com os marcados por símbolos.

Dom Demétrio Valentini, Bispo de Jales-SP e presidente da Cáritas do Brasil.

quinta-feira, setembro 08, 2011

UM DEUS ARRECADADOR

Que um pregador da fé arrecade dinheiro deixando claro que é para seu grupo entende-se. A objeção começa quando ele diz que Deus pediu aquele dinheiro e o transforma num Deus arrecadador. Pregadores com conceito errado de Igreja e de Deus às vezes escravizam seus fiéis ao dízimo, em nome da justiça para com Deus e para com sua Igreja de resultados. Pintam um Deus que não perdoa o dízimo, porque o dinheiro de Deus é sagrado. E citam as passagens que lhes interessa citar, ante os olhos atônitos dos fiéis que não lêem toda a Bíblia. É um dos abusos da Teologia da Prosperidade. “Pague seu dízimo em dia que Deus abrilhantará os seus dias…” A frase é bonita, mas não se sustenta. Deus não age desta forma!
Este conceito de um Deus que exige a sua parte acontece com freqüência nos lábios de pregadores unidirecionados. Dia 23 de fevereiro p. passado, um famoso pregador, respondendo sobre a obrigatoriedade do dízimo usou de perigoso sofisma. A fiel perguntou-lhe se, no caso de grave doença em casa, ela poderia não dar o dízimo para Igreja e usar também os 10% para cuidar do familiar enfermo. Ele respondeu com um sorriso irônico, perguntando se o Governo aceitaria que ela não pagasse o imposto, por conta de um filho doente! Se tem que dar para o Governo o dízimo do país, tem que dar para a Igreja o dízimo de Deus…
Argumento errado e tendencioso! Um bom advogado lhe aconselharia a nunca mais usar este argumento, porque é falso! O Governo brasileiro é misericordioso para com os doentes. Ignorante ou mal assessorado, o pregador mostrou o Governo brasileiro mais compassivo do que Jesus… Nosso Governo, com vários ateus a legislar no Congresso, dá à igreja dele uma lição de misericórdia através da lei 14.260 de 2003 da Receita Estadual. Em diversas outras leis dá isenção de IPVA, ICMS, IOS e IPI. A Lei Federal 10.182 de 2001; a lei 690 de 2003, a lei 10574 de 2003 permitem isenções. A portaria 349/ 96 também libera de imposto. Em caso de doença genética, insuficiência cardíaca cardiomiopatia, doença pulmonar crônica obstrutiva, enfisema, tuberculose, hepatite crônica ativa, o paciente tem isenções.
Para câncer de pulmão, o paciente tem direito a medicamento gratuito. Artrite invalidante, lúpus, paraplegia, doença do neuromotor, miastenia grave e doença desmielizante, tudo tem ajuda do Governo que dá isenção de imposto de renda. Um acidentado pode comprar carro com isenção de IR. Alguém com doença grave pode levantar o seguro de vida e recebê-lo em vida, pode quitar casa própria na CEF e pode levantar o FGTS inteirinho. Além disso, há uma instrução normativa 375 e 2003 que isenta do IPI os remédios importados.
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O pregador, com ironia e um sorriso plácido de quem sabe das coisas, ao insistir no dízimo devido a Deus através da sua igreja, deu a entender que Deus não tem a mesma misericórdia que o Governo, num caso de enfermidade em casa! Se ele tivesse lido melhor sua Bíblia que explica tão bem, acharia centenas de versículos que mostram o Deus que perdoa e leva em conta a aflição dos seus filhos.
O próprio Jesus diz que era permitido comer espigas em dia de sábado e que o sábado foi feito por causa do homem e não o homem por causa do sábado. (Mt 12,1) A lei tinha que ser flexível quando uma ovelha caísse no poço. (Mt 12,11) E recriminou os fariseus pela sua dureza de coração. Ridicularizou o fariseu que disse que pagava o dízimo em dia, mas se achava melhor do que o pecador lá atrás no templo… Sua fala tinha endereço certo.
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É bem verdade que Abrão deu o dízimo de tudo, mas quando caiu na tentação de dar mais do que o dizimo, ao sacrificar o filho Isaac, Deus interferiu. A oferta tem limites! Malaquias 3,8 fala dos que roubam a Deus quando lhe negam o dízimo. Citá-lo sem citar outras passagens não é justo, nem honesto. No “Pai Nosso” Jesus manda orar pelo perdão de nossas dívidas, assim como nós prometemos perdoar nossos devedores. Dízimo também é dívida perdoável! Em Mt 18,27-32 um senhor movido de compaixão perdoou a dívida de um servo. Este, porém não perdoou a do colega que lhe devia bem menos e o pôs na prisão… Foi punido! Os fiéis deveriam ouvir também estas histórias e aplicá-las ao dízimo.
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Se o Governo perdoa impostos e dívidas de quem está com graves problemas em casa, as igrejas deveriam fazer o mesmo. Revelam-se mais cruéis do que o Governo, cujos impostos são altíssimos. Um advogado presente naquela hora deveria ter levantado a mão e explicado ao pregador que, sim, o Governo perdoa os impostos. Algum teólogo ou biblista deveria ter acrescentado: e Deus também, milhares de anos antes, fez a mesma coisa!
Andam pintando um Deus arrecadador que não perdoa. Este não é o Deus nem do Antigo nem do Novo Testamento. Nosso Deus tem dó da multidão com fome…(Mt 9,36; 15,32) e condena quem cobra o que a pessoa não tem como pagar. (Mt 18,25-32) Circulem também este folheto entre os fiéis! Generosos para com Deus e para com suas igrejas, sim! Medrosos e encurralados por um dízimo que oprime, não! Se houver doença grave em família, o pregador tem a mesma obrigação que tem o Governo. Pega mal quando o Governador perdoa e o sacerdote não!

Pe. Zezinho, scj, Cantor, compositor e escritor.

terça-feira, setembro 06, 2011

Pe. THEODORO SNIJDERS: uma vida, uma história, uma missão (I)


Às poucas pessoas que lêem esse pequeno blog, peço licença pra iniciar uma série de postagens apologéticas a um homem que marcou a minha vida e acredito que também a vida de muitas outras pessoas. Pra alguns o que escreverei será “pucha-saquismo”, pra outros será reconhecimento, pra outros não será nada.

Vou falar de Pe. Theodoro Snijders, scj, um sacerdote holandês que dedicou-se completamente ao serviço do povo, principalmente o povo mais carente, nos diversos lugares onde trabalhou. De tais lugares, o que teve o privilégio de receber a obra desse grande homem por mais tempo, foi o meu querido município de Apodi, ou melhor, a Paróquia de Apodi, que contava com diversos municípios a  alguns anos atrás (Apodi, Felipe Guerra e o território da atual paróquia de Itaú).

Mais do que dados biográficos, destacarei a personalidade de Pe. Theodoro, com seus defeitos e méritos. Penso que tenho propriedade pra falar dele pela convivência que tivemos e por conhecer bem o seu trabalho à frente da Paróquia de Apodi, na qual esteve durante vinte e sete anos.

Pra ilustrar a minha afinidade com ele, revelo alguns detalhes que estreitam ainda mais os meus laços com ele: nasci no ano de 1983, ano de sua chegada a Apodi, fui batizado por ele e também crismado, pois aos dois de maio de 2002 havia uma grande número de jovens para serem crismados, e o então bispo diocesano Dom José Freire chamou Pe. Theodoro para ajudá-lo; foram formadas duas filas para o conferimento do sacramento, e eu escolhi a fila que se direcionava a ele.

Iniciei minha caminhada pastoral em 1998, e ele sempre foi uma presença importante nessa caminhada, incluindo o meu ingresso no seminário em 2003 e até os dias de hoje. É uma presença constante, que mesmo ausente fisicamente, sempre foi e será presente pela pessoa que é, pelo incentivo e sobretudo pelo testemunho.

Em breve, continuarei a minha apologia ao “Vigário de Apodi” como ele se auto-intitulava.

sábado, setembro 03, 2011

Fé mal explicada


O amor é tanto que comemoramos anúncio, concepção, nascimento, momentos da vida, morte e ressurreição de Jesus. Também comemoramos concepção, nascimento, momentos de vida e morte de Maria, a mãe dele. Amor suscita memórias!
Quando tive chance de explicar a um desses irmãos aguerridos de outra igreja, expus o porquê desses nomes e dessas datas. Se ele se satisfez, não sei, mas parou de discordar. Aceito ouvir as explicações deles, mas quero o direito de explicar os meus porquês. Não sou um crente visceral; sou crente cristão católico que estuda. Por isso celebramos os mistérios e vivências de ontem e neles, nossos mistérios e nossas vivências.
1-Anunciação, a 25 de março, por conta do anúncio feito pelo anjo a Maria. Ela seria mãe de alguém especial. Está nos evangelhos.
2-Imaculada Conceição a 8 de dezembro, porque, para nós, o primeiro instante de uma vida é sagrado. O primeiro instante da vida da mãe de Jesus para nós e motivo de festa. Está na Tradição.
3-Natal a 25 de dezembro porque o nascimento de Jesus fez a diferença no mundo. Está nos evangelhos.
4-Natividade de Maria a 8 de setembro porque, se o menino que dela não foi um menino qualquer, ela também não foi menina qualquer. Está na Tradição. Além de festejarmos sua concepção imaculada festejamos seu nascimento.
5-Nossa Senhora das Luzes ou da Candelária no dia 2 de fevereiro; das Dores, dia 15 de setembro, um dia depois do dia da Santa Cruz porque ela estava lá aos pés do filho que morria. A iluminada é também iluminadora. Por isso, oramos a ela para que ore por nós durante nossa vida e na hora em que estivermos morrendo. Ela viveu isso com o Filho!
Durante o ano temos mais de 40 dias especiais, nos quais lembramos algum mistério da vida de Jesus ou da vida de Maria associada à de Jesus.
6-Ascensão alguns dias depois da Páscoa porque ali Jesus se despediu prometendo que voltaria, mas nunca mais foi visto com os olhos da carne.
7-Assunção, porque seremos todos levados para o céu, para onde não podemos ir por nossas próprias forças, mas lembrando que Maria morreu de morte bem mais serena do que a nossa e que, para ela o céu não trazia dúvidas. Foi passagem serena. Já tinha tido o céu no ventre. Nossa assunção é bem menos festiva. Morrer ainda nos assusta, isto porque não temos a correta dimensão de céu em nós.
Assim, as doutrinas e dogmas que cercam Jesus e seus santos, sobretudo Maria, para nós são festas maiores ou menores, a depender do enfoque devocional desta ou daquela cidade ou paróquia.
Pergunte a um católico devidamente instruído na fé e ele saberá responder porque ora, a quem ora, como ora e porque celebra algum dogma ou acontecimento. Os que lêem menos sabem menos. Mas está tudo lá nos livros oficiais da Igreja. Creio e sei porque creio, celebro e sei o que celebro.
***
Perguntei a um grupo de católicos atuantes qual a diferença entre Ascensão e Assunção e entre Nossa Senhora da Conceição e Natividade de Nossa Senhora. Tiveram dificuldade de responder. Em algum lugar de sua formação alguém se esqueceu de mergulhar nos porquês de nossa devoção.
Agiu coerentemente o pároco de uma ativa comunidade católica, quando escalou uma equipe de jovens para explicar em letras grandes num painel à entrada do templo, a cada festa, o que ela significava e, se fosse a vida de algum santo, o resumo de sua vida, atuação e pensamentos. A mesma equipe foi encarregada de colocar uma breve placa de explicação diante de cada imagem que havia no templo, com a corresponde citação bíblica. Resgatou conceitos e fundamentou suas celebrações.
Deixa a desejar a paróquia ou templo que por anos a fio apenas mostra imagens e celebra festas sem jamais explicar a catequese que elas expressam. Resultado: temos sido uma igreja mal vivida porque mal explicada.

Pe. Zezinho, scj, Cantor, compositor e escritor.

quinta-feira, setembro 01, 2011

Gritos e respostas


Na Semana da Pátria deste ano vai acontecer o 17º. Grito dos Excluídos. Pela sua continuidade, e pelas repercussões que ainda suscita, o Grito se apresenta como uma das iniciativas bem sucedidas da CNBB, levada em frente pelas Pastorais Sociais.

Foi realizado pela primeira vez em 1995, ano da Campanha da Fraternidade sobre os Excluídos.

Aí já encontramos um dos motivos do acerto deste evento. Ao longo de todos os anos, ele sempre fez questão de retomar o tema da Campanha da Fraternidade, mostrando seus desdobramentos em torno de situações concretas, que mais exigem nossa atenção. O Grito faz repercutir a Campanha da Fraternidade. Como, por exemplo, neste ano com a campanha sobre a vida no planeta, o Grito nos provoca lembrando que "pela vida grita a terra, por direitos todos nós!”.

Outra razão que explica o sucesso do Grito foi o fato de vincular sua promoção ao Dia da Pátria. Desde a primeira edição, em 1995, a intenção era recuperar para a cidadania a celebração do "Dia da Pátria”, com manifestações que envolvessem os movimentos sociais, garantindo espaço para os que se sentiam, por um motivo ou outro, "excluídos” dos benefícios a que todos têm direito como cidadãos do mesmo país.

Esta é outra circunstância que ajuda a desenhar o quadro de referências do Grito dos Excluídos. Ele nasceu como gesto concreto da Semana Social, que tinha por tema "O Brasil que nós queremos”.

Desde o seu início, o Grito se colocou a serviço da cidadania, incentivando a participação popular em torno de grandes causas que o povo precisa assumir.

Como a história da proclamação da nossa independência vem associada ao "Grito” de Dom Pedro, o Grito dos Excluídos vem nos alertar que a soberania de nosso país precisa ser assumida sempre, de maneira consciente e articulada.

Por isto, em cada ano, não faltam causas, com a ênfase de gritos que apelam para os nossos compromissos de cidadãos.

Entre tantas, podemos citar algumas, que estão sendo assumidas pelo Grito deste ano.

Uma delas é a corrupção. Ela merece nosso repúdio constante. Ela precisa ser combatida com firmeza e sem complacência. Este combate deve ser sustentado pelo poder público, mas precisa ser apoiado pela cidadania.

Outro grito que precisa ecoar com mais clareza é contra a droga. Estamos chegando ao limite da tolerância. A nação corre perigo! A população, em especial a juventude, não pode mais ficar exposta à ganância de inescrupulosos, que permanecem impunes enquanto vidas inocentes são ceifadas em números assustadores. O combate contra a droga exige mais vigilância de nossas fronteiras territoriais. Mas exige também que nos demos conta que os caminhos da droga são abertos pela perda de valores morais, com o consequente abalo de nossas instituições. Além de enérgica ação do poder público, o combate contra a droga precisa contar com a corajosa recuperação dos critérios éticos que precisam presidir a nossa convivência familiar e social.

Outro Grito, que já começa a ficar impaciente, é por uma eficaz reforma política. Ela precisa desencadear um processo, que não pode prescindir da regulamentação dos instrumentos de democracia direta, que a Constituição já prevê, mas que até agora não foram regulamentados com clareza e segurança.

Outro tema de enorme responsabilidade se coloca agora em torno do novo Código Florestal, cuja votação está tramitando no Congresso. Em torno deste Código Florestal é necessário superar os radicalismos, para se chegar, com lucidez e equilíbrio, a compatibilizar os objetivos da proteção ao meio ambiente com os objetivos da agricultura. A discussão em torno do Código Florestal precisa se transformar em bom instrumento de consensos razoáveis, que levem em conta todas as dimensões implicadas neste complexo assunto, cheio de consequências práticas, que não podem ser ignoradas, ou atropeladas por bandeiras que escondem interesses ou carregam ingenuidades.

E assim o Grito pode ir levantando outros assuntos, como os agrotóxicos, a reforma tributária, a reforma previdenciária, a questão da moradia urbana, as barragens, e outros mais. A cidadania agradece!

Dom Demétrio Valentini, Bispo de Jales e presidente da Cáritas Brasileira.

Fonte: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=59780

segunda-feira, agosto 29, 2011

Faraós e pecados do poder


“Surgiu no Egito um novo rei, que não conhecera José. Ele disse a seu povo: ‘Olhai como a população israelita ficou mais numerosa e mais forte que nós. Vamos tomar providências em relação a eles, para impedir que continuem crescendo e, em caso de guerra, se unam aos nossos inimigos, lutem contra nós e acabem saindo do país.’ (…) Depois o rei do Egito disse às parteiras dos hebreus, chamadas Sefra e Fua: ‘Quando assistirdes as mulheres hebreias no parto e chegar o tempo do parto, se for menino, matai-o; se for menina, deixai-a viver. Mas as parteiras tinham temor de Deus: não faziam o que o rei do Egito lhes tinha mandado e deixavam viver os meninos. (…) Um homem da casa de Levi casou-se com uma mulher de seu clã. A mulher concebeu e deu à luz um filho. Ao ver que era um menino, manteve-o escondido durante três meses. Não podendo escondê-lo por mais tempo, pegou uma cesta de papiro, calafetou-a com betume e piche, pôs dentro dela o menino e deixou-o entre os juncos na margem do rio. A irmã do menino ficou parada à distância para ver o que ia suceder. A filha do faraó desceu para se banhar no rio, enquanto suas companheiras passeavam na margem. Ela viu a cesta no meio dos juncos e mandou que uma criada o apanhasse. Quando abriu a cesta, viu a criança: era um menino que chorava. Ficou com pena e disse: ‘É uma criança dos hebreus’. A irmã do menino disse, então, à filha do faraó: ‘Queres que eu te vá chamar uma mulher hebreia, que possa amamentar o menino?’ ‘Vai’, respondeu-lhe a filha do faraó. E a menina foi chamar a mãe do menino.” A filha do faraó disse à mulher: ‘Leva este menino, amamenta-o para mim, e eu te pagarei o teu salário.’ A mulher levou o menino e o criou.” (Ex 1,8-10. 2,1-9) A escravidão do povo hebreu e o infanticídio dos meninos são pecados do poder político, no Egito.

A política dos “faraós” de hoje, em países da Ásia e da África, penaliza, especialmente, as meninas. A prática do “aborto seletivo de fetos do sexo feminino é aparentemente generalizado em países asiáticos como a China, Índia e Coréia do Sul”. Com efeito, “A discriminação de gênero começa cedo. Modernos instrumentos de diagnóstico para a gestação tornaram possível determinar o sexo do bebê logo no início. Nos locais em que há uma evidente preferência econômica ou cultural por filhos homens, o mau uso dessas técnicas pode facilitar o feticídio feminino. Embora não haja evidências conclusivas para confirmar esse mau uso ilegal, histórias sobre nascimentos e dados de recenseamentos na Ásia – principalmente na China e na Índia – revelam uma proporção excepcionalmente alta de nascimentos de meninos, assim como de meninos com menos de 5 anos de idade. Essa constatação sugere a ocorrência de feticídio e infanticídio seletivos por sexo nos dois países mais populosos do mundo – apesar das iniciativas para erradicar essas práticas nos dois países.” Como consequência da “política do filho único” na China, “O número de moças que falta já estaria na casa de milhões e as causas são facilmente identificáveis: elas foram vítimas de infanticídios, de abortos provocados pelos pais quando descobriam que o feto era uma menina ou foram abandonadas nas encruzilhadas das ruas quando recém-nascidas. Alguns pais as escondem e não as declaram ao Estado, correndo perigos de sanções e prisão, se forem descobertos.” Em alguns países da África, a mentalidade da população e a política governamental são, igualmente, discriminatórias, em relação às meninas.

Moisés, como diz o seu nome, foi “salvo das águas”, graças à sensibilidade da “filha do faraó”, diante da decretação do infanticídio de meninos hebreus, no Egito, por razões políticas. O infanticídio de meninos e meninas, apenas nascidos ou em tenros anos de vida, continua acontecendo, por motivo político e em razão da mentalidade arraigada na prática de alguns povos. A face cruel do feticídio e do infanticídio se generaliza, no mundo, por razões sociais. Por isso, a legalização do aborto é um pecado do poder político e social.


Dom Genival Saraiva França, bispo de Palmares-PE.

terça-feira, julho 26, 2011

Pe. ZEZINHO ANALISA A TELEVISÃO BRASILEIRA

RZ :  Em 2002 a revista, Carta Capital de 06.03.02 fez uma reportagem de peso sobre a Televisão, dizendo que ela ia de mal a pior no Brasil.  Como o Sr. Avalia, hoje, o nível da televisão no Brasil?
Pe. Zezinho- Acho que a televisão brasileira é criativa, tem um bom desempenho tecnológico, é altamente intuitiva, faz muito depressa as adaptações necessárias nesse veículo tão ágil. Como um todo, ela é muito inteligente. Eu jamais poderia ser contra a televisão, porque ela é uma das maravilhas do mundo moderno. A minha objeção vai na linha do texto de Carta Capital, assinado por Mauricio Stycer, se não me engano.  Eu também li e mostrei aos meus alunos. É a certos tipos de programas e de programadores. Eu jamais combateria a televisão como se fosse algo do demônio. Não é. É algo de Deus. Mas lá dentro há programas e pessoas que transformaram a televisão num caça- níqueis  a qualquer preço moral, psicológico e social. Então deturparam o verdadeiro objetivo da televisão.
R.Z : Gosta do veículo, mas não de todos os seus condutores…
Pe Zezinho : Minha crítica é aos programadores e a alguns dos programas, não todos. Há programas de altíssimo nível na televisão brasileira e eu tiro o chapéu para esses repórteres e programadores. A gente pode se sentir orgulhoso desses programas, mas também podemos sentir vergonha de outros. Como um todo eu daria uma nota boa para a televisão brasileira, descontando esses programas.

R Z- Muitos religiosos acusam a televisão, dizendo que ela tornou-se vulgar…
Pe. Zezinho-    Não só os religiosos. Há jornalistas, psicólogos, advogados e juízes dizendo a mesma coisa. E, o importante, pais e mães de família que sabem o que tais cenas causam nos seus filhos. De repente é chocante uma mãe te que discutir com a filha de 16 anos porque esta insiste em dançar na varanda da casa aos olhos de quem passa como Carla Peres e em usar na rua um shortinho como o da dançarina super aplaudida na mídia. As mães não querem as filhas fazendo aqueles gestos lascivos, Quem ensinou isso? A TV.

RZ: Mesmo assim, a TV é uma boa escola ?
Pe Zezinho :  Há bons programas . Infelizmente temos que nos policiar, porque ela não se policia. Criticar tudo é errado, mas apoiar essas vulgaridades é abdicar do papel de pregador da fé. Por isso elogio no que devo e critico no que devo, como cidadão e como sacerdote e evito aceitar convites para programas onde se ridiculariza a pessoa humana, onde se expõe sem razão alguma a nudez humana e o erotismo e se mostra com leviandade a violência. Não tenho medo de ser chamado de conservador por isso. Prefiro ser progressista do meu jeito, no que realmente entendo como progresso. Acho que explorar a nudez, a violência ou a dor humana é retrocesso. Como cidadão, escolho aonde quero ir e que programas quero ver. Não estou julgando ninguém. Estou apenas usando meu direito de ir e vir e de ir ou não ir. Não sou obrigado a ir à televisão. Nenhum contrato me obriga a isso. Irei se quiser. Ligo, se quiser.

RZ: O que responde quando alguém como o Ratinho no ar o censura por não querer ir lá?
Pe Zezinho :  Soube ele fez isso anos atrás quando outros padres iam lá. Acho que foi uma só vez. Estava no seu papel. Almoçaria tranqüilamente com o sr. Carlos Massa, mas não iria ao programa do seu personagem Ratinho. Ele sabe disso. Esses dias (13.12.04) ele pegou um pênis eletrônico e o levou às mulheres presentes no auditório para que o tocassem. O programa, como está arquitetado, não servia e ainda não serve para mim, que hoje não daria mais ibope, como naqueles dias. Ir lá seria o mesmo de dizer que concordo com aquele esquema. Poderia fazer o mesmo bem que ele diz que faz para os pobres, sem falar o que fala, do jeito que fala e com aqueles gestos absurdos que incluem atos como aquele que descrevi.

Acho que tenho o direito de escolher meu púlpito. Corro o risco de não ter ninguém para me ver, enquanto quem vai lá tem milhões de pessoas. Mas tenho 38 anos de viagens ininterruptas pelo mundo. Acabo de voltar da China  e a perspectiva de falar a pouca gente não me assusta.  Já fiz isso. Também já falei para milhões.  O que não acho certo é ir aonde não me derem condições de dizer o que penso.

RZ: Não seria o caso de a Igreja valorizar os programas populares, mesmo com alguns exageros?
Pe Zezinho :  Se fossem só alguns eu iria, mas são freqüentes e são muitos. Jogam com isso! Faço uma distinção entre divulgar, popularizar e vulgarizar.  A linha que separa essas práticas é tênue. Na televisão  brasileira observa-se isso com clareza.  O vulgar tomou o lugar do popular em muitos programas populares. Vulgus em latim seria o povão, as pessoas anônimas. Popularizar seria tornar algo acessível aos que não tiveram acesso a certo grau de ensino e  de cultura. Mas não é porque o povo não estudou, que tem que agüentar a falta de arte ou a baixaria de certos programas, que repetem o tempo todo as mesmas piadas grosseiras os mesmo chavões, os mesmos requebros, as mesmas danças e as mesmas pessoas repetindo vinte palavras iguais o tempo todo.

De tanto mostrarem e divulgarem seus corpos seminus,  muitas mulheres caíram no vulgar: Vulgarizaram o que é bonito e é sempre especial. A vulgarização venceu a divulgação e a popularização. Mostra-se muita coisa sem nenhum intuito cultural. É o que muita gente está chamando de cultura do lixo. Nem sequer tomam o cuidado de reciclar.
R Z-   Alguns programas de televisão exageram na vulgaridade?
Pe. Zezinho-  Sem dúvida. Isso, porque ‘aparecer’ tornou-se uma palavra importante no mundo, depois que aconteceu a televisão. Estão chamando a isso de “evasão de privacidade” . Muita gente vai lá sem ter o que mostrar ou o que dizer. Vai para aparecer e ser vista, porque, ganhando visibilidade talvez cheguem aonde querem. Há cantoras e atrizes que jogam com isso. Estão sempre na mídia, porque estão sempre trocando de namorado e sendo vistas em situação de desafio.   Algumas cantoras e cantores, para ganhar visibilidade, escolhem uma dança erótica ou a nudez. Não hesitam em provocar escândalo, desde que isso venda seu disco. Eu disse alguns porque há os que cantam com enorme dignidade e grande amor pela arte. Mas é próprio da vulgaridade aparecer, mesmo sem ter o que dizer ou mostrar. Isso também pode acontecer na religião. Há um jeito popular e um jeito vulgar de pregar a palavra de Deus. Infelizmente há!

R Z- O sr. é a favor de algum tipo de censura à televisão?
Pe. Zezinho- Sou a favor de que as escolas, as famílias e as igrejas promovam uma censura a partir do povo e mentalizar as pessoas para desligarem aquele botão, ou procurar outro canal. Sou a favor de criar a mentalidade de não aceitar lixo na porta da nossa casa. Eu acho que a TV não é culpada de produzir o lixo. O lixo já existe fora dela. Mas a televisão se comporta como um caminhoneiro que foi incumbido de transportar algumas coisas atravessando a cidade. O que era aproveitável e bom, deveria levar ao destino certo, os dejetos ele deveria despejar diretamente no lixão. Só que o caminhoneiro  inverteu as coisas. Jogou o lixo nas portas das casas e acabou dando pouca importância às coisas boas. Eu penso que às vezes a TV age mais como lixeiro que enlouqueceu. Quando a televisão não distingue mais entre lixo e produto de primeira qualidade, já perdeu sua função de divertir e informar.

RZ:  Mas não há igrejas jogando com o mesmo vale-tudo e o mesmo sensacionalismo?
Pe Zezinho  : Vulgarizar a fé com milagres falsos e ameaças de diabo e inferno também é lixo. Dizer que dor de cabeça, vômito e resfriado é coisa do demônio é lixo. E quando o povo não sabe escolher entre o que é bom e o que é lixo, é sinal de que não foi preparado para fazer a opção. Não estamos, no Brasil, educando o telespectador para controlar a televisão. O telespectador precisa entender que nós é que temos o controle: não eles. Para sobreviver, eles precisam dos institutos de pesquisa tipo Vox Populi ou Ibope e, se nós deixássemos de assistir a esses programas, eles nos obedeceriam. Inverteu-se a ordem: quem deveria mandar na televisão era o povo, mas é a televisão que está mandando no povo.

R Z-  E o conteúdo das  novelas? É raro um sacerdote que opine em favor .
Pe. Zezinho-  Nem tudo é ruim. Mas é verdade que há novelas que atentam contra a moral cristã. Começo citando uma novela que fez muito sucesso, Terra Nostra. Deveria ter se chamado ‘Troca-Troca Nostro’ (risos), porque lá todo mundo ficou com todo mundo. O que também é uma inverdade, porque, no início do século, a moral era muito rígida e essas coisas não aconteciam com tanta freqüência. Portanto, a novela pintou um quadro moral errado da época e estava impingindo às pessoas uma falsa cultura, porque não traduzia como foi, de fato, a vida dos primeiros imigrantes italianos, seja em São Paulo, seja nas colônias. Eles tinham uma moral muito rígida. E a impressão que davam, no ‘Troca-Troca Nostro’, é que a moral era totalmente devassa. Portanto está prestando um desserviço à história e aos primeiros italianos que aqui vieram. Diga-se o mesmo de A Padroeira e O Quinto dos Infernos. O povo simples acaba pensando que naquele tempo era tudo dissoluto e devasso.

RZ: Fizeram isso para ter mais audiência ou porque querem pregar uma nova moral ?
Pe Zezinho : Isso eu não saberia dizer . Teríamos que perguntar aos autores.  A televisão, as novelas, de um modo geral, transmitem uma mensagem subliminar que influencia. Vimos há poucos anos todas as adolescentes dançarem como Carla Perez, ou com o “É o Tchan”, vestirem-se como suas atrizes preferidas e decidirem qual é o ator mais bonito do momento. Adolescentes de 15 anos eram expostos à dança e aos movimentos eróticos de uma atriz de mais de 20 anos como Tiazinha e Feiticeira, como prêmio por terem acertado uma pergunta. Isso está longe de tudo o que se entende por pedagogia. É a mais crassa inversão de valores que há. Eu me pergunto se há algum outro país onde isso acontece. Como prêmio por saber uma verdade o adolescente podia ver as nádegas de uma professorinha.  Querem convencer a quem de que isso não influencia os adolescentes? A campanha contra a baixaria na televisão começou muito tarde. Deveria ter vindo há 20 anos atrás.
RZ: No seu entender há programas que criam  costumes errados.
Pe Zezinho :  Isso. Por mais que digam que não e que apenas retratam , eles criam. As escolas não fazem isso que a TV faz. Oferecer como naquele tempo uma Feiticeira e uma Tiazinha como prêmio não é retratar, muito menos ensinar. É criar comportamento errado. Cria expectativa, faz a cabeça, faz o sentimento e, às vezes, cria modismos. Essa estória de dizer que a televisão apenas reflete a realidade não é verdade. Ela cria. E é culpada sim. Voltemos à estória do lixo. Ela não faz o lixo, mas distribui. Tem tanta culpa como quem fez. Ela cria emoções falsas, cria necessidades falsas e leva ao pecado intencionalmente. Torno a dizer: nem todos os programas. A televisão tem um pouco de santo e outro de diabo.

R Z- As novelas retratam com fidelidade a figura do padre?
Pe. Zezinho-  A novela traduz o ideário dos seus escritores. A maioria deles raramente teve convivência com o clero. Se teve, às vezes foi negativa. Então eles jogam para o cenário nacional o conceito que eles têm do padre. Não é o conceito que o povo tem do padre. Mas, com o tempo, acaba pegando. Acontece o mesmo com os pastores ou com os muçulmanos. Há sempre os dois elementos o bom e o mau.  De repente passam a idéia de que pastor corre atrás de dinheiro e de que padre corre atrás de mulheres; ou, ainda, que é um indefinido, um sujeito confuso que não é totalmente homem e que não é totalmente pecador. A idéia que passam é que não existem valores. Passam a idéia de que o  valor supremo é a mudança, é o desafio. Realmente a proposta básica da maioria das novelas é atéia e amoral, mesmo que tenha alguns personagens que falam de Deus. E é claro que não podemos aceitar isso.

RZ: Ela desafia a família ?
Pe Zezinho : A seqüência de novelas dos últimos anos mostra que sim. Ela destrói sistematicamente os valores cristãos sobre família e sobre sexualidade. Os casais desajustados são sempre em maior número do que os casais felizes. Você imagine os males que a televisão causa fazendo isso durante 40 anos. O púlpito deslocou-se da igreja para aquela câmera de televisão e os pregadores não são mais os padres; são os artistas. Os formadores de opinião não são mais os teólogos; são os escritores de novela. O evangelista de ontem é o novelista de hoje. Mas o novelista de hoje não anuncia um novo reino, nem Jesus e, sim uma nova liberdade. A Televisão está virando uma espécie de religião no Brasil. Ela decide que tipo de padre mostrar e que tipo de fé retratar.  Já falamos disso!

domingo, julho 24, 2011

SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO COBRA O ÓBVIO E ESQUECE O ESSENCIAL

Excelente comentário da Jornalista Anna Ruth sobre mais uma declaração autoritária da secretária de educação do Rio Grande do Norte.

terça-feira, julho 19, 2011

IGREJA: SINAL DE SALVAÇÃO

Por ANTÔNIO MESQUITA GALVÃO, Doutor em Teologia Moral

A Igreja continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo  e as consolações de Deus (Santo Agostinho).
Até hoje existe muita gente que possui dúvidas a respeito do que é Igreja, como ela acontece e se organiza na história. A Igreja é aquele lugar onde o plano de Deus se realiza em sua integridade. Como instituição humano-divina, ela não é a salvação em si, mas um sinal desta. Sendo a espiritualidade uma experiência que sempre nos traz uma percepção sobre Jesus sob a ótica da fé, o elemento significativo dessa crença aponta e incorpora um entendimento específico de Deus, e de sua revelação em Jesus de Nazaré. Como sinal de salvação a Igreja é o lugar e a instância onde o cristão vive e desenvolve sua espiritualidade. É salutar que se saiba que o sinal de salvação está na Igreja-comunidade e não na igreja-templo.
O entendimento das coisas do Alto é vivido e sustentado em uma comunidade de fé que tem o nome de ecclesia (reunião de convidados, igreja). Neste tópico vamos refletir sobre a Igreja, mais como um dom de Deus do que como lugar de ritos, templo de pedra. Nessa atividade ela é a aquela instância que concorre para a salvação da humanidade. Mais adiante vamos abordar outra dimensão eclesial: a comunidade.
Há uma gnoma temática atribuída a São Cipriano († 258) que afirma que "Fora da Igreja não há Salvação. Esta frase, que para muita gente pode parecer algo meio arrogante, é uma realidade, e uma realidade profunda. Fora da Igreja não há nem pode haver Salvação porque a Igreja é o Corpo de Cristo, é Jesus continuado na história e é só por ele que podemos ser salvos. Ninguém é salvo por alguma pessoa, padre esse ou padre aquele. Estes podem, no máximo, ajudar as pessoas a chegar mais perto da Igreja, logo a chegar mais perto de Cristo. A Igreja é, portanto, a visibilidade de Cristo no mundo.
A Igreja tem, séculos afora, recebido uma série de definições, cujo valor conceitual varia de época, confissão e até de ideologia. Referimos ao templo como igreja (com i minúsculo) e à comunidade, dom de Deus como Igreja (com i maiúsculo). As definições formam um corpo doutrinário capaz de nos ajudar a entender essa realidade que é, ao mesmo tempo, graça e mistério. Assim temos:
·Povo de Deus (LG 9.17; DV 14; AG 2)
· Corpo Místico de Cristo (cf. Rm 8,17; 1Cor 12,12; Ef 4,7);
· A noiva e esposa do Cordeiro (cf. Ef 5,25; Ap 21,2; 22,17);
· O próprio Cristo continuado e presente na história.

Dentre os mistérios da Divina Providência, já ensinava Pio XII em 1943, impenetráveis à nossa inteligência, Deus quis um como que tocável pela mão: o mistério visível da Igreja imorredoura no meio do mundo. A Igreja é o grande mistério visível. Por sua natureza globalizante o mistério é particularmente objeto da experiência da fé, conforme ensina L. Boff (in: E a Igreja se fez povo. Ed. Vozes, 1991).
Freqüentemente, quando falo a auditórios cristãos, em conferências, cursos e retiros espirituais, escuto algumas perguntas, como "Quem fundou a Igreja?” ou "A Igreja existe desde quando?”. Embora a resposta pareça simples, ela traz consigo algumas implicações histórico-teológico-exegéticas que precisam ser bem esmiuçadas com vistas a uma boa compreensão dos fiéis. Por causa do mistério, a idéia de Igreja não se esgota em simples definições.
Primeiro, a Igreja tem origem nas qahal, assembléias que os hebreus realizavam no deserto, no tempo do êxodo. Tais reuniões, com o tempo passaram das tendas ao templo e daí às sinagogas. Com o advento do cristianismo, vemos Jesus Cristo idealizando o agrupamento dos seus seguidores emcomum-unidade, sempre empregando verbos no tempo futuro ("edificarei minha Igreja...”). Hoje, é voz corrente e teoria aceita que a Igreja foi fundada em Pentecostes, pelo Espírito Santo, que a rege e preside. Há também idéias mais místicas que apontam para uma fundação a partir do sangue derramado pelo coração de Jesus ou, no dizer de Santo Agostinho, "a água e o sangue fundaram e nutrem a Igreja...”.
A verdade é que a interioridade de Deus é uma "Igreja” no sentido de graça, acolhida e benevolência. Quando estamos em união espiritual com o Pai, vivemos o mistério eclesial da comunhão e da participação. É um erro a visão de certas pessoas, ou grupos, que associam a idéia de Igreja com um simples templo material. O edifício não é Igreja; Igreja são os fiéis. O prédio é templo, e templo até certo modo, pois o verdadeiro templo do Espírito de Deus é o coração dos que crêem e se abrem ao assédio da graça (cf. 1Cor 3,16; 6,9). Mais adiante, poderemos ver, para fins ilustrativos, o que não é Igreja. No Concílio Vaticano II os Bispos do mundo inteiro, sucessores legítimos dos Apóstolos, ensinaram que:
A Igreja é, unida a Cristo, como que um sacramento, isto é, um sinal e instrumento da íntima união com Deus e de todo o gênero humano (LG 1).
Isto quer dizer que a Igreja vive de/em Cristo. Na sua ressurreição, ele derramou sobre sua Igreja o seu Espírito Santo – o mesmo Espírito com o qual o Pai o ressuscitou dos mortos. Assim, a Igreja vive do Espírito de Cristo e no Espírito de Cristo... como o corpo que vive da vida da cabeça, como os ramos que vivem da seiva do tronco:
Ele é a Cabeça da Igreja, que é seu corpo (Cl 1,18).
O Pai o pôs acima de tudo, como cabeça da Igreja, que é seu corpo (Ef 1,22).
Eu sou a verdadeira videira e meu Pai é o agricultor. Eu sou a videira e vocês são os ramos. Aquele que permanece em mim e eu nele produz muito fruto porque sem mim vocês não podem fazer nada (Jo 15,1.5).
Estes textos são importantes porque nos mostram que há uma união real, concreta, verdadeira, entre Cristo e a comunidade de seus discípulos, que é a Igreja. Não pode haver um ecclesia sensum (um sentido de Igreja) sem uma estreita ligação com as dores do mundo. Em 1981, há portanto trinta anos, o teólogo Leonardo Boff afirmou (in: Igreja, carisma e poder, Ed. Vozes) que
A Igreja em sua reflexão e prática (pelo menos na América Latina) está sendo contemporânea a estas exigências (de evangélica solidariedade). Não chega atrasada com modelos inadequados. Está conseguindo estar a altura dos desafios. A sociedade futura latino-americana terá uma presença estrutural dos elementos cristãos e evangélicos, graças à Igreja que está ajudando a gestar o futuro. Esta verdade é tão forte que analistas já ponderam: uma sociedade latino-americana que não incluir em seu processo, em grau elevado, elementos cristãos, estará se revelando antipopular. A matriz do povo é cristã; esta matriz está sendo expressa dentro de uma codificação que responde às demandas históricas. É a chance de mostrar todo o seu vigor e sua verdade. É nessa direção que caminha a esperança e se define o futuro mais promissor da Igreja da América Latina.
A mensagem libertadora de Jesus, que delineou o itinerário a ser seguido pelos apóstolos, com vistas à instauração da ekklesia tou kyriou, seria iluminada mais tarde com as luzes do Espírito Santo. Nesse particular, a festa de Pentecostes não comemora apenas a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos e a Virgem Maria, mas, sobretudo celebra a fundação da Igreja, a qual é presidida pela Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.
Desde aí, a Igreja de Cristo, apesar das divisões e vacilações, fenômenos tipicamente humanos, tem sido uma presença constante e efetiva entre povos e nações. Sua trajetória pode ser analisada dentro de coordenadas históricas e culturais, onde ela faz parte da história da civilização e desempenha importante papel em todas as épocas da caminhada da humanidade.
Quando o Império Romano desapareceu como estrutura política e cultural, a Igreja foi sua sucessora, buscando resguardar, sob a bandeira do cristianismo, a unidade do mundo ocidental da época, bem como numerosos elementos da cultura greco-romana, que assimilou e cristianizou. Se de um lado é verdade que a Igreja é uma instituição que possui uma administração regida por um conjunto de normas, e é operada pelo que se convencionou chamar de hierarquia, de outro lado é bem verdade que a Igreja é, antes de tudo, o conjunto do povo de Deus, os batizados (in: A. M. GALVÃO. Curso Básico de Teologia. Ed. Pão & Vinho, 2002).
Assim, no terreno conceitual podemos definir a Igreja, de acordo com o que preconiza o Concílio Vaticano II (LG 20) como:
Comunidade dos que crêem em Cristo, confortados pelos sacramentos e assistidos pelo Espírito Santo, que peregrinam pelo mundo, juntamente com seus pastores, continuando a obra da salvação.
A palavra igreja não tem origem religiosa desde o princípio. Ela possui sua origem no grego, onde evvkklhsi,a (ekklesía) significava uma "assembléia” ou uma "reunião de convidados”, já que o verbo ek-kalem, raiz de ekklesía, tem sentido de convidar ou chamar quem está de fora. Do grego o verbete chegou ao latim como ecclésia, já com sentido religioso de uma comunidade.
O verbete igreja aponta, portanto, para o sentido de uma convocaçãoou reunião de convidados, e designa historicamente as "assembléias do povo” (cf. At 19,39). Dando a si mesma o nome de ekklesía, a primeira comunidade dos que seguiam a Jesus se reconhece herdeira das qahaldo deserto. Nela Deus convoca, há séculos, o seu povo desde os confins da terra (CIC 751).
A missão da Igreja será completa quando a aurora do Reino plenamente realizado, surgir no horizonte: então a grande luta travada no tempo atingirá sua conclusão e a vitória de Deus, Senhor de todas as coisas, resplandecerá nos novos céus e na nova Jerusalém Celeste (In: B. FORTE. Exercícios Espirituais no Vaticano. Ed. Vozes, 2005.
É a partir da Igreja que vamos descobrir Jesus como sinal (sacramento) do Pai, e é justamente naquela que é "sinal de salvação” que estabeleceremos nossa união com Cristo. Ela é aquela assembléia visível e – ao mesmo tempo –a comunidade espiritual, instituição terrena e celeste, que mostra o caminho da salvação, ultima o resgate e proclama os direitos do homem. O papa Bento XVI, cardeal Joseph Ratzinger, um dos mais insignes teólogos do nosso tempo, nos ensina a respeito dessa união através de um texto deveras revelador:
A "mística” do Sacramento que se funda no abaixamento de Deus até nós, é de um alcance muito diverso e conduz muito mais alto do que qualquer mística elevação que o homem poderia realizar [...]. A união com Cristo é, ao mesmo tempo, união com todos os outros aos quais Ele se entrega. Eu não posso ter Cristo só para mim; posso pertencer-lhe somente unido a todos aqueles que se tornaram ou se tornarão Seus. A comunhão tira-me para fora de mim mesmo projetando-me para Ele e, deste modo, também para a união com todos os cristãos. Tornamo-nos "um só corpo”, fundidos todos numa única existência. O amor a Deus e o amor ao próximo estão agora verdadeiramente juntos: o Deus encarnado nos atrai todos a si (Bento XVI. DCE 16).
Inserida no grande projeto de salvação, a Igreja tem uma missão insubstituível e indelegável que éevangelizar e batizar (cf. Mt 28,19s; Mc 16,16). Evangelizar é anunciar a Verdade de Jesus, santificar o mundo segundo Deus, renovar a humanidade a partir de dentro, iluminar o mundo com a mensagem libertadora de Cristo, promover a dignidade, individual e social das pessoas e – por fim – colocar-se a serviço, especialmente dos mais fracos, dos que sofrem, dos excluídos e dos que clamam por justiça e paz.
Tudo na Igreja vem do amor do Deus Três Vezes Santo: o coração pulsante da Igreja é o agápe, o amor que vem do alto e tende a voltar para o alto. O agápeé a regra de vida dos discípulos de Jesus, que por força de sua revelação acreditam no amor infinito do Pai. O kathós nos faz compreender que a Igreja vive do dinamismo fundamental de deixar-se amar pelo Pai, por Cristo, no Espírito Santo, a fim de amar o Pai, por Cristo e no mesmo Espírito. Amados pelo Amado, somos amados para amar (B. Forte. Idem).
Okathós a que Bruno Forte, o pregador de retiros do Vaticano, se refere, deriva-se do verbo kathassiôo(kaqasio,w), santificar-se, purificar-se no sofrimento. No aspecto das características, podemos enxergar a Igreja divina e a Igreja humana, a qual foram atribuídas quatro notasuna,santacatólica (universal) eapostólica. Antes do Concílio Vaticano II (1962-1965), a Igreja era vista como uma instituição perfeita. Hoje, depois de séculos de controvérsias e questões, se diz que a Igreja é santa e pecadora, isto é tem santidade porque vem de Deus e a ele conduz, e é pecadora porque é feita de homens.
A Igreja, como povo reunido e instituição, tem vocação profética. Deve ter fé no caminho de Jesus, confiando na força de Deus e de seu Reino, para poder anunciar uma mensagem de liberdade (J. COMBLIN. O Caminho. Ensaio sobre o seguimento de Jesus. Ed. Paulinas, 2004).
Ressaltada a característica libertária da Igreja, é preciso enxergar nela aquela sociedade destinada a promover a salvação dos homens. Santo Agostinho diz que é impossível mantermos o Deus-Trindade em nosso sacrário interior, se não tivermos amor por sua Igreja.
O Espírito Santo que temos corresponde ao amor que temos pela Igreja de Cristo.
A salvação do Cristo presente na sua Igreja é um mistério que eclode no ser humano e revela sua condição de filho de Deus, iluminado pelo Espírito Santo e remido pelo sangue redentor de Cristo. Definir perfeitamente a Igreja está fora do alcance das pessoas. Ela é graça e mistério e essas duas grandezas são indecifráveis, tornando-se apenas dignas de louvor e adoração. A Igreja é mistério porque vindo de Deus e estando a serviço de seu projeto, é sinal e instrumento de salvação. É graça porque ocorre de graça, expressando a gratuidade dos dons de Deus que é rico em misericórdia.
A comparação da Igreja com o corpo de Cristo projeta um raio de luz sobre a íntima relação entre a Igreja e Cristo. Não está somente reunida em tornoa ele: está sempre unificada nele, em seu Corpo. Três aspectos da Igreja "corpo de Cristo” se deve ressaltar mais especificamente: a unidade de todos os membros entre si, por sua união com Cristo; Cristo cabeça do Corpo: a Igreja esposa de Cristo (CIC 789).
Fiel à Igreja e ciente da profundidade da sua missão, São João Crisóstomo († 407) ressalta a importância do ser humano participar dela em todas as instâncias da vida, preparando o caminho que leva ao céu.
Não te separes da Igreja! Nenhuma potência tem a força dela. Tua esperança é a Igreja. Tua salvação é a Igreja. Teu refúgio é a Igreja. Esta é maior que o céu e maior que a terra. Ela nunca envelhece: sua juventude é eterna!
Por se tratar de uma sociedade composta de homens, a Igreja – por causa de sua dimensão humana – traz consigo todos os problemas inerentes a essa condição. Por isto se diz que ela é santa e pecadora. Santa porque vem de Deus e para ele converge e encaminha; pecadora por causa de sua condição humana, frágil, vacilante, vinculada ao barro de Adão. Por conta dessa limitação, os teólogos modernos não cansam de alertar que a Igreja sempre carece de conversão (cf. LG 8: GS 21).
É esta a Igreja-comunidade que existe na vida prática, a qual por conta da sua dimensão humana, não devemos idealizar. Reunida em Puebla, no México, em 1979, a Igreja reconheceu, através de seus teólogos e bispos, essa necessidade de conversão às opções de caridade, cujas exigências dimanam na fé que se coloca a serviço:
Afirmamos a necessidade de conversão de toda a Igreja... Para viver e anunciar a exigência da pobreza cristã. a Igreja deve rever suas estruturas e a vida de seus membros [...] com vistas a uma conversão efetiva (P 1134; 1157).
Assim convertida às exigências da solidariedade e do amor ao próximo, a Igreja poderá tornar-se o grande sinal do amor de Cristo pela humanidade. Essa conversão traz consigo a exigência de um estilo de vida austero e crescente, no campo da espiritualidade, da moral e vida pastoral. Para essa mudança a Igreja sabe que pode e precisa contar com a graça de Deus. No entanto, teologia e espiritualidade que se desviam da idéia da cruz salvadora, não terão muita coisa a dizer sobre a real presença de Jesus nos sofrimentos, fracassos e pecados da humanidade.
Deste modo, é preciso distinguir aquela porção de santidade que existe na Igreja, e que justamente é o dom que Deus dá para a salvação de todos os homens e mulheres que deixam triunfar em si a fé, o amor, a esperança, o perdão e a partilha. A santidade da Igreja significa a presença de Deus em seu seio, através da ação santificadora do Espírito Santo.
O Espírito Santo não se limita a santificar e a dirigir o povo de Deus por meio dos Sacramentos e dos mistérios ordenados, e a orná-los com as virtudes, mas também nos fiéis de todas as classes, "distribui individualmente e a cada um, conforme entende, os seus dons” (1Cor 12,11) e as graças especiais que os tornam aptos e disponíveis para assumir os diversos cargos e ofícios úteis e à renovação e mais incremento da Igreja (LG 12).
No mistério amoroso presente na Igreja, nos deparamos com uma realidade na qual Deus adquiriu para si um povo que antes não tinha nenhum valor, mas que pela intervenção redentora do Filho, tornou-seraça eleitasacerdócio real e nação santa (cf. 1Pd 2,9). Por isto ela é unasanta,universal (católica) eapostólica. Sob essas características a Igreja se constitui, como instituição, a partir dos humildes, convidados pobres, que se espalharam ao redor do Mar Mediterrâneo, e que se foram nucleando pela Palestina, Ásia Menor, Grécia, Norte da África e Roma.
Mesmo assim, depois de conquistar o Império e inaugurar a era constantiniana, a Igreja nunca esqueceu suas raízes pobres. Em toda a rudez de um processo civilizatório que então se iniciava, ela se reservou (pelo menos em muitos lugares) o cuidado dos pobres, para cuja assistência revelou uma impressionante habilidade criativa (in: P. BIGO et alli. Fé cristã e Compromisso Social. Ed. Paulinas, 1981).
A partir do delineamento de sua missão, a Igreja carece um despertar, um vigor missionário, capaz de levar aos povos a boa notícia da salvação. A espiritualidade missionária não pode, em nenhuma hipótese, ser desencarnada, impessoal nem muito menos anacrônica. Estar com Jesus e com os homens é o binômio referencial de uma Igreja que se propõe a ser sinal de salvação.
A ação missionária é um ato de espiritualidade e do amor, em que o crente procura imitar o Mestre. No múnus da missão, como comunidade salvífica, a Igreja se torna peregrina no mundo, na busca de difundir o evangelho e testemunhar a verdade. Como diz Santo Agostinho
A Igreja continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus (In: Civ. Dei. XVIII, PL 41,614).
Assim como a Igreja não é a salvação em si, mas um sinal e indicativo dela, igualmente ela não é o Reino, como afirmavam alguns no passado, mas igualmente um sinal deste. Em face, ressalta-se a figura da Igreja como comunidade dos filhos de Deus para, através dos séculos, realizar a dimensão terrena, aquela que prepara a instauração do Reino dos céus. Por esta razão se diz que a Igreja, mistério da graça, é já na terra o germe e o princípio do Reino. Esse germe deve nascer na história sob o influxo do Espírito Santo, até o dia em que "Deus seja tudo em todos” (cf. 1Cor 15,28). Até então, alerta o documento conciliar, "a Igreja permanece perfectível sob muitos aspectos, necessitada de permanente auto-evangelização, de maior conversão e purificação”.
Jesus não veio ao mundo apenas para nos manifestar sua divindade, ou para nos revelar os grandes problemas da existência humana. Ele veio – e os evangelhos são claros – para que tivéssemos a vida abundante (cf. Jo 10,10), para resgatar o que tinha perecido (cf. Lc 19,10). Este é o verdadeiro objetivo da encarnação do Filho de Deus: oferecer a salvação, isto é, a vida plena, aquela felicidade que o ser humano perdeu desde a expulsão do Paraíso, plenitude que anseia sem conseguir encontrá-la nas coisas do mundo.
Jesus veio para nos dar vida, não individualmente, mas em comunidade. Para tal, constituiu um povo que tem um nome especial: a Igreja, comunidade de salvação e, ao mesmo tempo depositária dos meios para consegui-la (in: D. GRASSO. O Problema de Cristo. Ed. Loyola, 1967).
A Igreja, como povo de Deus em marcha é uma realidade dotada de um dinamismo particular e de uma fé inquebrantável. Trata-se de um corpo de pessoas chamadas a uma vocação especial, geradas misteriosamente para a vida divina, incorporados a Cristo, animados pelo Espírito Santo e tornados capazes de viver uma forma de espiritualidade agradável a Deus. Esta é como uma radiografiada Igreja.
De outro lado, às vezes muitos de nós chegam a confundir a figura da Igreja como uma instituição burocrática, como são algumas "paróquias”, ignorando seu verdadeiro significado e adotando por norma aquilo que "não é Igreja”. Esta questão, de um rico espírito crítico, porém real, está muito bem enunciada em Esquema de Meditações e Rollos, do Secretariado Nacional de Cursilhos de Cristandade do Brasil. São Paulo, 1982,

·um templo de pedra material, edifício feito por mãos de homem;
·uma simples sociedade religiosa;
·somente uma hierarquia que manda (em alguns casos tiraniza) organizada quase militarmente;
·espécie de "poder legislativo” que regulamenta a vida religiosa dos fiéis; ou – pior – um "poder executivo”;
·instituição fora de moda; anacrônica;
·sociedade de seguros eternos;
·lugar de ritos mágicos, tais como Sacramentos, Missas, bênçãos, etc.

Como um itinerário da Igreja, sinal de Salvação, há que se observar a trajetória da graça de Deus na história, onde Jesus, pelo evangelho, pelos sacramentos que ele deixou e por ele próprio (ele que é a salvação de Javé) nos lega pelo poder do Espírito Santo, a Igreja, operadora de graça, com vistas à salvação da humanidade que crê:
Criação→ Povo escolhido → Profetas → Cristo → Espírito Santo → Igreja
Qual a visão que temos da Igreja? Como mestres, o que ensinamos e que características destacamos em nossas pregações e aulas? Cremos naquilo que ensinamos? Há toda uma missão de resgatar a verdadeira doutrina sobre a Igreja, rejeitando as falsas teorias do adversários e inimigos de Cristo.
Na conclusão deste tema, é salutar que compreendamos que a Igreja é um sinal de salvação no mundo, sinal esse que ocorre pela gratuidade da graça da fé e do amor (LG 2.5.9.14; GS 32.40). A salvação, para que não nos gloriemos, não vem das obras humanas, mas do poder e da misericórdia de Deus, valores esses manifestos na Igreja de Cristo.
Ela (a Igreja) encontra força no poder do Senhor ressuscitado, para vencer na paciência e na caridade, as próprias aflições e dificuldades internas e exteriores e, para revelar ao mundo, com fidelidade, embora entre sombras, o mistério de Cristo, até que por fim ele se manifeste em luz total (LG 8).
A Igreja, de acordo com a doutrina paulina, é o Corpo de Cristo, também conhecido como corpo místico de Cristo,onde ele é a cabeça e nós os seus membros. Esta composição é eminentemente mergulhada em um mistério, razão pela qual é chamada de mística.
E sujeitou todas as coisas a seus pés, e sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos (Ef 1,22s).

[Excerto da aula inaugural proferida pelo autor em abril/2009 em um Centro de Estudos Superiores de Teologia (Mestrado) em Minas Gerais].

REFLEXÃO PARA O 4º DOMINGO DA PÁSCOA – JOÃO 10,11-18 (ANO B)

O evangelho do quarto domingo da páscoa é sempre tirado do capítulo décimo do Evangelho de João, no qual Jesus se auto apresenta como o ún...